XP lança produtos ESG e vai aplicar R$ 100 milhões para fomentar o mercado

Com capital semente para fundos de ações e opções de investimento a partir de R$ 500, supermercado financeiro traz produtos mais sustentáveis para o 'varejão'

XP lança produtos ESG e vai aplicar R$ 100 milhões para fomentar o mercado
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Enquanto vem crescendo de vento em popa lá fora, por aqui o mercado de produtos financeiros mais sustentáveis se vê preso a uma espécie de dilema de Tostines: falta produto porque falta investidor ou falta investidor porque falta produto? 

A XP dá um passo importante para atacar o lado da oferta.

Numa tacada mais imediata, está lançando hoje um fundo de gestão passiva chamado Trend ESG Global que replica carteiras de ETFs globais focados em sustentabilidade. O tíquete inicial é de R$ 500, inaugurando um mercado praticamente deserto de opções para o ‘varejão’.

Na mesma direção, mas num movimento mais transformador, o maior supermercado financeiro do país vai lançar no próximo mês um fundo de fundos (ou FoF, na sigla em inglês) que aplicará somente em estratégias de ações que passam por filtros ambientais, sociais e de governança (ESG). 

Diante das poucas opções de fundos hoje disponíveis, separou R$ 100 milhões de seed money para colocar em novos produtos com esse viés e ajudar a alavancar o segmento. 

“Queremos ser uma espécie de BNDES do mercado de ESG no Brasil”, diz Gustavo Pires, sócio e diretor da XP Asset, responsável pela plataforma de fundos.

“Muitos gestores locais vêm estudando a fundo esse tema há anos, mas esbarram num problema: é difícil mudar a estratégia completa dos principais fundos, mas ao mesmo tempo há uma incerteza sobre a demanda para criar um veículo específico. Queremos resolver esse problema.” 

Batizado de Selection ESG, o FoF deve nascer na primeira quinzena de julho com três fundos na carteira: o da gestora Fama, que adota os critérios socioambientais no seu principal produto, além dos da Constellation e da JGP, que criaram veículos exclusivos para as estratégias ESG. 

Segundo Pires, no entanto, outras quatro gestoras estão próximas de lançar seus produtos específicos e devem entrar na carteira do Selection nos próximos meses, bancadas pelo capital semente da tesouraria da XP. Questionado se uma dessas gestoras poderia ser a própria XP Asset, ele não quis confirmar, mas não descartou a possibilidade.

Os cheques para cada gestora podem variar entre R$ 5 milhões e R$ 15 milhões — ou seja, há potencial para fomentar até 20 fundos.

A tendência entre as gestoras com que a XP vem conversando é a montagem de um fundo que replica a estratégia do ‘flagship’ da casa, mas com filtros ESG que excluam alguns setores ou empresas ou limitem o peso das posições de acordo com os riscos ambientais, sociais ou de governança. 

Pires aposta no efeito multiplicador desses critérios para o mercado brasileiro. “Em mercados mais amadurecidos em relação ao tema, a prática ASG começa a ficar tão entranhada que você passa a levar em consideração efetivamente para composição de todo o portfólio.” 

O Selection também será um produto democrático: a aplicação mínima será de R$ 500, com taxa de administração de 0,75% ao ano e prazo de resgate de D+60.

Trend ESG Global

O fundo passivo disponibilizado a partir de hoje pela XP ataca o problema de falta de produtos para a pessoa física, mas tem baixíssima exposição a Brasil. 

O Trend ESG Global tem uma exposição e 50% ao iShares MSCI USA, 40% ao iShares MSCI EAFE (que leva em conta países desenvolvidos, excluindo Estados Unidos e Canada) e 10% ao iShares ESG MSCI EM, que aplica em países emergentes. 

Na prática, o Brasil tem um peso de apenas 0,44% na carteira, o que mostra a baixa penetração das estratégias ESG no país. Entre os papéis que entram no índice de países emergentes estão B3, Localiza, Renner, Banco do Brasil, Bradesco e Itaú. 

Os setores de tecnologia e financeiro são os de maior peso na carteira, que tem como principais posições Apple, Microsoft, Amazon e Alphabet. A taxa de administração é de 0,50% ao ano, com liquidez em D+5. O produto não tem exposição cambial.

Tem demanda? 

Gestores locais costumam dizer que há pressão dos investidores internacionais por adoção de critérios ESG, mas que é preciso quase ‘empurrar’ a estratégia goela abaixo dos brasileiros, que ainda acreditam que a preocupação social ou ambiental implica deixar dinheiro na mesa. 

A XP, no entanto, diz acreditar que tudo é uma questão de educação. 

“Achamos que o ESG é uma tendência global para esta década, assim como o ETF e os fundos passivos foram nos últimos anos”, diz Pires. “Para essa demanda acontecer, a gente precisa orquestrar no sentido dela, desenvolver bons produtos e enquadrá-los são os primeiros passos.” 

Ele vê espaço para criar produtos ESG para outras categorias, com destaque para os fundos de previdência. “O mercado de fundos de previdência é correlato, naturalmente deve ser a próxima fronteira dos investidores de ações quando falamos de ASG.” 

Mas tudo a seu tempo. “Sempre digo: vamos calçar as sandálias da humildade, reconhecer que tem uma curva de aprendizado e que não dá pra tentar atropelar o mercado.” 

Diretoria de ESG

O anúncio dos primeiros produtos com viés socioambiental veio menos de uma semana depois de a XP criar uma diretoria de ESG, sob o comando de Marta Pinheiro. Na XP há três anos, a executiva estava a cargo da área de novos negócios e inovação.

A área de ESG é transversal, e dará apoio tanto à agenda corporativa da própria XP quanto ao desenvolvimento de produtos e estratégias para os clientes. Por ora, a equipe tem tem três pessoas, mas a ideia é ampliar o time nos próximos meses. 

“Acreditamos muito no crescimento do mercado ESG no Brasil. Nosso papel vai ser suportar com educação e com produto. Isso vai ser parte da jornada de trazer mais conscientização e luz para o tema”, diz Pinheiro. 

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