Tesla mira brasileira Sigma – mas venda esbarra em preço

Venda da empresa, que produz lítio em Minas Gerais, é questão de tempo; resta saber se o comprador será montadora, fabricante de baterias ou outra mineradora

Mineração de lítio, um dois elementos essenciais das baterias e da descarbonização dos setor de transporte
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Uma possível oferta da Tesla pela brasileira Sigma Lithium colocou a mineradora brasileira de lítio no holofote do mercado global de baterias e carros elétricos nos últimos dias. 

A informação, trazida pela Bloomberg, não é confirmada por nenhuma das partes. Mas é uma questão de tempo para que a Sigma seja vendida para uma montadora de automóveis, fabricante de baterias ou mineradora.

A CEO Ana Cabral não esconde de ninguém que esse é o objetivo final da A10 Investimentos, a gestora de private equity da qual é sócia com Marcelo Paiva, que botou a Sigma de pé e ainda é sua maior acionista, com 48% do capital. Cabral tem repetido, inclusive em eventos da empresa, que considera seu trabalho feito e que não pretende ser a operadora das minas.

Mas tudo é uma questão de preço – e timing para chegar até ele. A empresa, posicionada para se tornar uma das quatro maiores produtoras de lítio do mundo dentro de um ano, vale hoje US$ 3,6 bi. A esse preço, a Sigma considera que uma venda seria um ótimo negócio… para o comprador.

Desde que a A10 comprou a parte da Magnesita numa pequena operação artesanal de lítio em Minas Gerais, há sete anos, a Sigma saiu do zero para ver seu valor escalar. 

Com ações listadas na bolsa de Toronto – e mais recentemente também na Nasdaq – atingiu a casa dos US$ 200 milhões em 2020, ultrapassou os US$ 700 milhões em 2021 e só nos últimos 12 meses valorizou quase 250%.

Mas, como deixa clara uma lâmina de apresentação a investidores, a empresa considera que está muito descontada em relação aos pares. A australiana Pilbara Minerals, que tem uma produção estimada para 2024 semelhante à da Sigma, vale hoje quase US$ 10 bi.

“A empresa tem uma tese de reprecificação, com alguns gatilhos”, diz Marcelo Barros, sócio da JGP, investidora da Sigma.

A primeira delas é que a empresa está muito próxima de entrar em produção comercial, com previsão para abril. Havia muito ceticismo no mercado sobre a capacidade da Sigma de tirar o negócio do chão num segmento em que o Brasil não tem tradição; e fazer isso de forma relativamente rápida.

Barros diz que projeções conservadoras apontam uma geração de caixa de US$ 1 bi já em 2024. “E isso é só com a produção da fase 1”, diz ele.  “As fases 2 e 3 devem entrar em produção no fim de 2024 ou início de 2025 e a exploração da fase 4, que parecia menos promissora, tem surpreendido positivamente.”

A CEO Ana Cabral também tem dito com frequência que aposta na demanda diferenciada pelo lítio sustentável da Sigma – com empilhamento a seco, reciclagem da água, energia limpa, baixo uso de químicos e um forte trabalho social no empobrecido Vale do Jequitinhonha.

O produto da empresa deve ter condições, por exemplo, de atender às exigências do novo mecanismo de ajuste de fronteira (Carbon Border Adjustment Mechanism) que a Europa está criando para taxar a importação de produtos intensivos em carbono.

Além disso, bastante estimulado pelo lobby das montadoras de carros a combustão, o mercado de carros elétricos está começando a diferenciar o que são baterias produzidas de forma poluente daquelas com cadeias de fornecimento sustentáveis.  

Montadora ou mineradora?

Como costuma acontecer, a notícia do possível interesse da Tesla fez com que outros potenciais compradores se mexessem, segundo pessoas com conhecimento do assunto. Mas uma venda só sairia agora se o eventual comprador resolver pagar na frente o prêmio que a empresa enxerga – o que parece pouco provável.

Outra das condições para um negócio, dizem duas fontes, é que ele envolva 100% do capital da empresa e não só a participação da A10. Além da JGP, são acionistas Ace Capital, Citrino, Nucleo Capital, CQS, BlackRock, Julius Baer e family offices dos Emirados Árabes e da Arábia Saudita.

Antes da notícia sobre a Tesla, semanas atrás a visita do premiê alemão Olaf Scholz ao Brasil despertou especulações sobre uma possível compra da Sigma pela Volkswagen. Um dos objetivos da passagem pela América do Sul, que incluiu Argentina e Chile, foi tentar garantir o suprimento de lítio para as gigantes automotivas da Alemanha.

Apesar da corrida de montadoras e fabricantes de baterias pelo lítio, uma aquisição pode ser mais óbvia para uma mineradora, que já saberia como operá-la. 

A australiana Rio Tinto já fez algumas aquisições no segmento. A brasileira Vale acaba de renomear sua área de metais básicos, que inclui cobre e níquel, para divisão de metais da transição energética e atraiu para o conselho Jerome Guillen, que comandou a divisão automotiva da Tesla e deixou a montadora em 2021.  

Mas o que desequilibra o jogo a favor de montadoras ou fabricantes de baterias elétricas são as bilionárias sinergias a serem capturadas ao colocar uma operação de lítio para dentro de casa – e como isso pode turbinar o preço que estarão dispostos a pagar. 

Nas contas de um analista, o ganho de sinergia por ano poderia chegar a US$ 2 bilhões considerando a produção projetada para a Sigma. 

O raciocínio é simples: o custo de produção da mineradora está na casa de US$ 500 a tonelada, mas o produto chega ao comprador a US$ 8 mil a tonelada. É essa diferença de US$ 7,5 mil por tonelada que uma Tesla da vida economizaria ao verticalizar sua operação.