Startup quer reflorestar a Mata Atlântica com drones

Francesa Morfo diz que seu sistema é 50 vezes mais rápido que plantio manual de mudas e atinge áreas de difícil acesso

Pedro Abreu/Morfo/Divulgação
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Reflorestamento é uma atividade cara e lenta mesmo em terrenos planos e de fácil acesso. Em regiões acidentadas, a complexidade – e o custo – aumentam muito.

A startup francesa Morfo está trazendo ao Brasil uma tecnologia que usa imagens de satélite e drones para dar mais eficiência ao plantio de árvores.

“No modo tradicional, uma pessoa planta em um dia uma área de 0,5 hectare a 1 hectare. Com nossos drones, esse número vai para 50 hectares”, diz o CEO da Morfo Brasil, Gregory Maitre. 

A Morfo produz cápsulas com sementes germinadas, que são lançadas do ar, muitas vezes em áreas em que o acesso de maquinário é inviável.  A densidade da dispersão das sementes varia de acordo com a região e com as condições climáticas. Um drone pode lançar cerca de 180 cápsulas por minuto.

Apesar desse componente futurista, a empresa afirma que a chave da sua tecnologia está nas cápsulas.

“Sem a cápsula, a maioria delas secaria ou seria comida. Então o que a gente faz?  Na véspera ou dois dias antes, ativamos aquela semente, ela começa a germinar e então colocamos na cápsula, que serve como uma proteção mecânica e também um casulo para [a semente] se desenvolver”, diz Maitre. 

Esse sistema pode reduzir em até seis meses o tempo em que as plantas passariam num viveiro, diz o CEO, pois cada uma das cápsulas contém os nutrientes necessários para o desenvolvimento inicial da árvore.

A empresa inaugura esta semana um projeto experimental na região de Santa Cruz Cabrália, a cerca de 30 km de Porto Seguro. Depois da Bahia, a startup deve fazer pilotos no Rio de Janeiro e no Paraná ainda este ano, em áreas de 20 a 50 hectares.

Sob medida

Fotos feitas pelos drones e imagens de satélites são usadas para analisar o terreno, entender as especificidades do local e determinar quais são as espécies presentes ao redor da área a ser restaurada.

Feito esse diagnóstico, são escolhidas as sementes mais adequadas, que serão coletadas por comunidades locais. “Para recompor cada ecossistema, nós precisamos plantar entre 30 e 50 espécies diferentes”, diz o cofundador Pascal Asselin. 

Cerca de 75% do plantio é feito usando drones, que são maiores e têm maior autonomia de voo que aqueles vendidos para o consumidor final. O restante segue o processo tradicional, com mudas plantadas manualmente. O custo total da restauração por hectare cai pela metade, de acordo com a startup.

O plano é testar 375 espécies até 2024 e catalogar suas características físicas, facilitando o processo de escolha do plantio nos próximos sistemas. No fim do ano passado, a startup captou € 4 milhões em sua primeira rodada de financiamento, liderada pelo Demeter IM, gestora europeia focada em transição ecológica e energética, e Raise Ventures, que apoia empresas em estágios iniciais.

A escolha pela Mata Atlântica se deu pelo seu grande potencial de restauração e de biodiversidade, afirma Asselin. O bioma tem apenas 12% de sua mata nativa remanescente, de acordo com a SOS Mata Atlântica. 

“A maturidade das comunidades e dos atores da região também é diferente, eles estão prontos para a restauração”, diz o cofundador. “Na Amazônia, você tem muitas questões com a agricultura e, para nós, era importante não estar em conflito com qualquer agronegócio”. 

Os trabalhos serão feitos em parceria com organizações que já atuam nas regiões, como o Instituto Terra e Preservação Ambiental, no Rio de Janeiro, e o grupo Natureza Bela, na Bahia. Elas funcionam como intermediadoras com os coletores locais e compartilham sua expertise técnica. 

Foco na faixa tropical

Fundada em 2021, a Morfo chegou ao Brasil no início deste ano, com um projeto piloto no município fluminense de Miguel Pereira. Antes, já fez trabalhos no Gabão e na Guiana Francesa, onde cresceram os cofundadores e irmãos Pascal e Hugo Asselin, que se juntaram ao amigo Adrien Pages para o empreendimento. 

Com o pai trabalhando na indústria mineradora, os irmãos Asselin acompanharam a exploração de regiões que precisavam ser restauradas ao fim do período de concessão.

Foi daí que veio a ideia do negócio, afirmam eles. O plano da startup é vender serviços de reflorestamento para companhias como mineradoras ou construtoras.

Outra possível linha de receita é a venda de créditos de carbonos, com o arrendamento de terras de pequenos proprietários. Os projetos na Bahia e no Rio de Janeiro já devem ser usados para esse fim. Apesar da experiência em outros países, a Morfo pretende se concentrar no Brasil.

O nome da startup vem da borboleta de asas azuis do gênero Morpho, presente em florestas tropicais da América Latina, e indica – aos mais entendidos de biologia – a faixa em que os cofundadores estão de olho no longo prazo. 

“Há 900 milhões de hectares no mundo prontos para serem restaurados sem impactar a atividade humana. Quando se foca em áreas tropicais e subtropicais, é 40% disso”, diz Pascal.