Sangue de beterraba na água: Beyond Meat vira alvo de ‘short sellers’

Nem parceria com a rede KFC é capaz de entusiasmar os investidores de uma das pioneiras em carnes à base de plantas

Sangue de beterraba na água: Beyond Meat vira alvo de ‘short sellers’
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A Beyond Meat foi a primeira produtora de imitações de carne à base de plantas a estrear na bolsa americana. Agora pode estar pagando o preço do pioneirismo.

Depois de um primeiro ano de euforia, quando suas ações quadruplicaram de valor, a empresa entrou em queda livre e os short sellers, que apostam na queda do papel, estão sentindo cheiro de suco de beterraba na água.

A startup tornou-se um dos principais alvos dos vendedores a descoberto (aqueles que alugam ações para vendê-las no mercado e comprar mais adiante por um preço mais baixo e lucrar com isso). Os movimentos contra a companhia foram responsáveis por 42% das negociações dos papéis na Nasdaq no começo desta semana.

É o maior percentual dentro do índice Russell 1000, que inclui as maiores empresas de capital aberto dos Estados Unidos.

Em entrevista ao Financial Times, Jim Chanos, fundador do hedge fund Kynikos Associates (cínico, em grego), afirmou que a Beyond Meat deixou de ser uma empresa de crescimento.

Embora o segmento de imitações vegetais ainda siga se expandindo, “já não é mais o caso da Beyond Meat”, afirmou Chanos, conhecido por ter alertado sobre a sobrevalorização da empresa de energia Enron, há duas décadas.

O gráfico das ações da Beyond Meat lembra um ecocardiograma nos dois primeiros anos pós-IPO, mas desde meados do ano passado o desenho é de um tobogã.

A empresa perdeu mais da metade do valor de mercado desde junho, e agora as ações são negociadas nos níveis da oferta inicial.

Nem o anúncio da semana passada de que a rede KFC vai oferecer nuggets feitos com o “frango de mentira” da empresa gerou muito entusiasmo entre os investidores.

Inflação e saturação

Uma das explicações foi o mau resultado do terceiro trimestre de 2021, anunciado em novembro. A companhia esperava receitas entre US$ 120 milhões e US$ 140 milhões, mas o número fechou em US$ 106 milhões.

“Vemos mais uma prova de que o negócio da Beyond está atingindo a saturação de mercado antes do que se esperava”, escreveu o analista Robert Moskow, do Credit Suisse.

As vendas de produtos de base vegetal explodiram no começo da pandemia, quando os consumidores passaram a fazer mais refeições em casa e muitos estavam experimentando esse tipo de produto pela primeira vez.

Mas, no ano passado, o crescimento estagnou: as vendas ficaram 0,5% abaixo das de 2020 – problemas nas cadeias de suprimentos globais também afetaram as vendas, segundo a SPINS, uma empresa que coleta dados do varejo.

Outro problema é a inflação nos Estados Unidos, maior mercado da empresa. O preço das carnes alternativas vem caindo, mas elas ainda custam mais caro que as proteínas animais que pretendem substituir.

Short squeeze?

Desde o surgimento do fenômeno das ações meme, a prática do short selling virou uma ideia arriscada.

Já se fala que a empresa pode ser candidata a mobilizar as hordas da internet para um short squeeze, como aponta o colunista David Jagielski, do site Motley Fool.

O short squeeze acontece quando o preço da ação alvejada pelos vendedores a descoberto começa a subir, o que pode resultar em perdas enormes para os short sellers, que apostavam numa baixa do valor das ações. 

Na onda das ações meme, investidores individuais se organizaram pela internet para inflar artificialmente as ações de empresas na mira dos short sellers, como a varejista de games GameStop ou a rede de cinemas AMC.

Mas a Beyond Meat não é um negócio ameaçado pela tecnologia. Pelo contrário: a companhia é um vetor da ruptura. As técnicas para criar proteínas que simulam o sabor, a aparência e a textura da carne animal ainda dão os primeiros passos.

A ideia de consumir menos proteína animal – seja por motivo de saúde ou por preocupação com os animais e o meio ambiente – continua ganhando adeptos.

E os próprios frigoríficos estão atentos a essa mudança de hábitos de consumo. Mesmo que o mundo não abandone completamente o bife ou o filé de frango, empresas do setor já se movimentam para oferecer proteínas alternativas.

A Marfrig tem a Plant Plus, uma joint-venture nos Estados Unidos com a gigante dos grãos ADM. A JBS adquiriu o controle da espanhola Bio Tech  e a BRF tem parceria com a israelense Aleph, ambas startups querem produzir carne em laboratório.