Quem são as candidatas a unicórnios da Amazônia

Aceleradora Amaz acaba de selecionar seis startups, de agricultura sustentável a geradoras de crédito de carbono

O fruto da palmeira macaúba, cujo óleo pode substituir o de palma e ser a base de biocombusíveis
O fruto da palmeira macaúba, cujo óleo pode substituir o de palma e ser a base de biocombusíveis
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A aceleradora Amaz acaba de escolher as seis startups que participarão do seu programa de 2022. As selecionadas são parte de uma aposta em negócios que consigam juntar crescimento rápido com respeito ao meio ambiente e impacto econômico na Amazônia.

Nascida dentro da Plataforma Parceiros da Amazônia (PPA), uma organização que reúne ONGs e setor privado, a Amaz levantou um fundo de R$ 25 milhões para dar o empurrão necessário a um tipo de negócio que faz todo o sentido no papel, mas que ainda não existe, diz Mariano Cenamo, fundador e CEO da aceleradora.

“Não temos a referência de negócios que cresceram exponencialmente resolvendo problemas sociais e ambientais”, diz Cenamo. “Estamos tentando encontrá-los.” 

A proposta atraiu 156 inscritas. 

As seis selecionadas vão receber R$ 200 mil e contarão com apoio em diversas frentes, de mentoria à extensa rede de contatos da aceleradora na região.

O programa dura um ano e, ao final do período, as companhias podem receber um aporte adicional de R$ 400 mil.

Em troca, a Amaz fica com uma porcentagem das companhias. Cenamo afirma que o modelo fica entre uma aceleradora tradicional e um fundo de capital de risco.

“Na aceleração, o empreendedor se expõe a muito conhecimento, mentores e ferramentas. Mas não adianta nada se ele não tiver combustível no tanque para rodar todos esses gadgets”, diz ele.

Isso provocou outra mudança em relação ao PPA. A Amaz dá preferência a startups que já estejam em um estágio mais avançado de desenvolvimento, preferencialmente gerando receita.

Com exceção da Mahta, uma foodtech que está na fase final do desenvolvimento de suplementos alimentares à base de produtos da floresta amazônica, as outras cinco selecionadas já estão em operação.

Dois andares

A Inocas, que desenvolveu um sistema silvipastoril – uma combinação de árvores, pastagem e gado – para produção de óleo de macaúba, está no pólo oposto. 

A companhia já recebeu investimentos milionários do Fundo Vale e da gestora de investimentos sustentáveis Mirova, provou a viabilidade do seu modelo em um projeto no Sudeste, e agora está olhando para a Amazônia.

A melhor maneira de entender o negócio da Inocas é pensar numa pastagem de dois andares, diz Johannes Zimpel, fundador e CEO da empresa.

No “térreo”, o produtor continua criando gado normalmente. A diferença vem com a construção do andar de cima, o que se faz plantando palmeiras no pasto.

As palmeiras melhoram a qualidade das gramíneas e do solo, e a sombra leve ainda beneficia os animais.

No topo das palmeiras, depois de quatro anos começa a colheita da macaúba (foto),  fruto do qual é extraído um óleo que tem o potencial de substituir o de palma, grande vilão do desmatamento no Sudeste Asiático.

A Inocas já implantou o sistema em uma área de 2.000 hectares na região de Patos de Minas (MG), e o plano é fazer o mesmo em 5.000 hectares no nordeste do Pará. A empresa já está em conversas para fornecer o óleo de macaúba para a Natura, que tem uma fábrica de sabonetes na região.

A alavanca do carbono

A BR Carbon, uma startup que desenvolve projetos de conservação florestal geradores de créditos de carbono, foi escolhida por dois motivos. O primeiro, diz Cenamo, é a qualidade do time técnico.

“É a melhor [empresa desse segmento] no Brasil, se não a melhor do mundo”, afirma o CEO da Amaz.

Esse é outro desafio da aceleradora: mostrar que existe vida além da Vila Olímpia ou do San Pedro Valley, o polo tecnológico de Minas Gerais.

Projetos de carbono costumam ser feitos no varejo, diz Bruno Brazil, fundador e CEO da BR Carbon. “Você tem de fazer a negociação e todas as validações técnicas caso a caso.”

A startup criou um modelo para escalar rapidamente suas iniciativas e, consequentemente, os benefícios para as populações locais.

“Um dos grandes esforços dos projetos de carbono são justamente o desenho, as auditorias e certificações. Temos quatro áreas no Acre e uma no Mato Grosso, todas reunidas num único projeto”, afirma Brazil.

A BR Carbon faz acordos com os proprietários e ocupantes das terras: em troca de conservação e do desenvolvimento econômico para as comunidades locais, eles recebem uma porcentagem do lucro da venda dos créditos.

O momento para expandir é ideal, diz Brazil. A primeira “safra” de créditos colhida pela startup já foi vendida antes mesmo das verificações finais, e as duas seguintes também já têm comprador. “A avidez por créditos é tão grande que tem demanda agora para cinco, dez anos no futuro.”

Mesmo quando não sejam a atividade fim do negócio, os créditos de carbono prometem ser um impulsionador para as startups da região, diz Cenamo.

“Esses serviços ambientais estão virando uma commodity e podem funcionar como uma grande alavanca.”

De Norte a Sul

Os dois Estados que mais apareceram na lista de candidatas à aceleração da Amaz foram Amazonas e Pará, como seria esperado. A surpresa, afirma Cenamo, foi o interesse de empresas de fora da região.

Em terceiro lugar ficaram as empresas de São Paulo, e uma delas foi escolhida: a Soul Brasil Cuisine, uma fabricante de alimentos que acaba de inaugurar uma fábrica no bairro da Barra Funda, em São Paulo.

Fundada em 2018 pelo casal Peter e Leticia Feddersen, a Soul Brasil quer levar os “sabores e os saberes” da Amazônia para o mundo.

A empresa criou três linhas de produtos – molhos de pimenta, geleias e molhos à base de vinagre e frutas – pensando no mercado internacional.

Mas, diferentemente das águas de coco em embalagem tetrapak ou da polpa de açaí congelada, a startup oferece um produto com rastreabilidade e história.

O principal ingrediente de um dos molhos picantes são pimentas colhidas por mulheres da etnia Baniwa, que vive no extremo noroeste do Amazonas.

“Doamos 10% do lucro das vendas desse produto para a tribo, para que eles possam reinvestir na produção”, afirma Peter.

Hoje, além da venda direta no site, a empresa exporta para Estados Unidos, Alemanha e Cingapura. O plano é usar o investimento recebido da Amaz para aumentar a presença internacional.

“Nosso plano é que, em cinco anos, 80% do faturamento venha da exportação”, afirma Leticia.

Completam a lista de seleção da Amaz a Floresta S.A., que implanta sistemas regenerativos para produção agroflorestal em grande escala, e a Vivalá, que organiza passeios turísticos em áreas de conservação envolvendo as comunidades locais.

(Atualizado às 11h45 para corrigir a informação de que o projeto da Inocas será realizado no nordeste, não no noroeste do Pará.)