OPINIÃO: Recuperar a Amazônia é mais que plantar árvores

O futuro da região depende da conservação da natureza unida a um modelo econômico que garanta uma vida melhor para 30 milhões de pessoas

Preparação do açaí em comunidade da floresta amazônica
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Não resta dúvida, hoje, de que a Amazônia é vista como um território que apresenta soluções com potencial para o desenvolvimento sustentável do Brasil e para a pauta ambiental-climática  mundial.

Esse entendimento sobre a maior floresta tropical do planeta ficou evidente durante os muitos debates que aconteceram na Climate Week em Nova York, entre os dias 19 e 25 de setembro.

Falta, porém, que o território amazônico seja visto em sua realidade: complexo, diverso e com múltiplos desafios ambientais, sociais, culturais e econômicos. Se os olhos dos brasileiros e do mundo permanecerem fechados às pautas urgentes da região, será difícil desenvolvê-la em todo seu potencial e protagonismo.

A realidade da Amazônia – ou das muitas Amazônias que abriga – é dura, além de encerrar singularidades. Seus territórios carecem de infraestrutura física e digital, logística, saúde, segurança e educação, seja em áreas urbanas ou em comunidades tradicionais e dos povos originários, e o desmatamento e queimadas batem recordes seguidos.

Mas, à medida em que se enxergam e se acolhem esses desafios, os caminhos e os elementos para eliminá-los ou mitigá-los também vão aparecendo.

Uma via possível está em encontrar modelos de desenvolvimento compatíveis com suas capacidades intrínsecas e sua realidade, a partir também de investimentos que o setor privado possa mobilizar.

Para isso, é necessário se aprofundar nos fundamentos de uma economia que seja mais eficiente na conciliação da conservação com a produção, abarcando, ainda, as demandas sociais de uma região em que vivem quase 30 milhões de pessoas, muitas delas invisibilizadas ou colocadas em situação de vulnerabilidade pelo sistema produtivo e econômico predominante localmente.

Ao se falar em novos modelos de desenvolvimento para esse território, os debates internacionais e nacionais têm dado atenção às soluções baseadas na natureza, em especial à restauração florestal.

Essa atividade é mais do que plantar árvores. Traz consigo diferentes oportunidades de geração de renda e emprego ao longo de das cadeias de valor relacionadas a produtos madeireiros e não-madeireiros e serviços ambientais, incluindo projetos referentes a créditos de carbono, além de co-benefícios como conservação da biodiversidade, sequestro de carbono e regulação das chuvas, fundamentais para o enfrentamento da crise climática.

Para que seja de fato efetiva, a restauração precisa de elementos que a fortaleçam e a propaguem, como investimentos em pesquisa e desenvolvimento e apoio a startups. É interessante planejar e implementar o que chamamos de “ilhas de excelência” na Amazônia, para que atividades como essas possam florescer.

Essas ilhas não são um sonho distante. Paragominas, no Pará, foi um município conhecido pelos altos índices de desmatamento, mas há quase 15 anos deu início a um processo de transformação para seguir pelo caminho do desenvolvimento sustentável, pelo qual é reconhecido hoje. Poder público, sociedade civil e setor privado uniram esforços para que isso ocorresse.

Sozinhos não conseguiremos percorrer este caminho. A atuação conjunta entre diferentes setores, não só nacionais como internacionais, será fundamental para transformar a realidade da Amazônia.

É preciso um plano audacioso e robusto, capaz de olhar de forma integrada para esse grande e rico mosaico que se apresenta nas Amazônias.

Ao abrimos os olhos para a realidade da Amazônia, poderemos abrir os caminhos para que ela possa nos proporcionar as soluções, em especial para a crise climática, de que o Brasil e o mundo tanto necessitam.

E, também, se juntar a um Brasil do futuro mais justo, produtivo, ciente das suas singularidades, democrático, solidário com o mundo e alinhado com a contemporaneidade.

(Izabella Teixeira, ex-ministra do Meio Ambiente, e Francisco Gaetani fazem parte do programa de fellowship do Instituto Arapyaú. Roberto Waack e Renata Piazzon são, respectivamente, presidente do conselho e diretora do Arapyaú. Todos são integrantes da iniciativa Uma Concertação pela Amazônia.)