O fundo de reflorestamento no Brasil que atraiu a Casa Branca

Estratégia do BTG que mistura restauração com plantio comercial de madeira recebe aporte de US$ 50 milhões de braço financeiro de desenvolvimento dos EUA

O fundo de reflorestamento no Brasil que atraiu a Casa Branca
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No mesmo comunicado sobre a liberação de US$ 500 milhões para o Fundo Amazônia, a Casa Branca anunciou um outro aporte no Brasil – desta vez numa iniciativa privada de reflorestamento, capitaneada pelo BTG Pactual. 

Espécie de banco de desenvolvimento americano, a U.S. Development Finance Corporation (DFC) está na fase final para liberar um empréstimo de US$ 50 mihões ao Timberland Investment Group (TIG), braço do banco que investe em terras para produção comercial de madeira. 

Com cerca de US$ 6 bilhões de ativos sob gestão, o TIG está captando US$ 1 bilhão para sua primeira estratégia de restauração, com foco na América Latina, especialmente no Brasil. 

A empresa não revela os números, mas informações de mercado dão conta de que cerca de US$ 250 milhões já foram levantados nos últimos dois anos, desde que a iniciativa foi lançada, especialmente com fundos de pensão e bancos de desenvolvimento. 

A ideia da TIG com a Landscape Capital é comprar pastagens degradadas e dar dois usos a elas. Em 50%, vai fazer seu negócio tradicional: plantação de espécies comerciais, como pinus e eucalipto. 

Na metade restante, fará reflorestamento com espécies nativas e restauração para proteção permanente. Aqui, a monetização ocorrerá exclusivamente por meio da venda de créditos de carbono. 

A Conservação Internacional, ONG ambiental de renome, é a consultora de impacto da iniciativa. 

“Estamos focando nos 140 milhões de hectares de pastagens que existem na América Latina, muitos dos quais são gerenciados de forma pouco sustentável, com apenas uma ou duas cabeças de gado por hectare, e que antes eram florestas”, afirma Gerrity Lansing, fundador e chefe da TIG. 

Desde o lançamento, em meados de 2020, cerca de 25 mil hectares já foram comprados no Brasil, diz ele. A meta é chegar a 300 mil hectares, incluindo também terras no Chile e no Uruguai, países em que a TIG já opera. 

“Estamos agregando pedaços menores de terra de maneira muito paciente, o que é tipicamente nossa estratégia”, diz o executivo. 

Enquanto boa parte das iniciativas de conservação e restauro mira a Amazônia, a TIG não trabalha com o bioma, focando principalmente nos Estados do Sul, Sudeste e Centro-Oeste, onde já atua com seu negócio principal. 

Ele não abre detalhes do empréstimo acordado com o DFC, dizendo apenas que foi desenhado em “condições bastante atrativas”. 

(Quase) mais do mesmo

Com o avanço do mercado de compensações de emissões via créditos de carbono, nos últimos anos vêm se multiplicando as iniciativas que se propõem a fazer reflorestamento em escala – como é o caso da re.green e da Biomas, que reúne seis grandes empresas brasileiras, de bancos a frigoríficos. 

Mas a TIG aposta na sua experiência como gestora de terras como diferencial na estratégia. “Nossa iniciativa é inovadora no sentido de que ela não tem nenhuma inovação”, brinca Lansing. “Estamos construindo em cima do que já fazemos há muitos anos.”

O reflorestamento com espécies nativas guarda diferenças relevantes em relação ao plantio de árvores para fins comerciais, mas o gestor afirma que, de forma geral, a dinâmica não é tão distinta.

“Uma parte [da restauração] é feita com o plantio de espécies nativas, mas em algumas áreas a regeneração pode acontecer apenas isolando a área e não permitindo mais acesso a ela”, diz. 

Questionado se o aumento da procura por terras para reflorestamento não acabou puxando os preços para cima, Lansing retorna à narrativa do business as usual: “Em qualquer geografia, em qualquer estratégia, se você tem terras boas e bem localizadas, há demanda por elas.”

O executivo não dá números sobre o retorno esperado da nova estratégia, mas afirma que estão em linha com os projetos tradicionais de timber e com o mesmo prazo, de 15 anos. “É uma estratégia comercial e competitiva, que não mira retornos subsidiados nem nada do tipo.”

Créditos de carbono

A TIG já começou a prospectar a venda de compensações de emissões de gases de efeito-estufa – e acredita que em cinco anos deve ter os primeiros créditos de carbono para colocar no mercado. 

Além dos créditos a serem gerados pelo reflorestamento da área que será destinada à preservação permanente, a firma quer vender créditos das espécies exóticas. “São essas que vão gerar os créditos primeiro”, aponta Lensing. 

Num momento em que há forte escrutínio sobre os mercados de carbono, ele afirma que a demanda por créditos de captura de emissões – em contraponto aos de conservação florestal, que tratam de emissões evitadas – continua forte e acima do que a gestora esperava quando começou a estudar o negócio. 

Mas potenciais compradores não estariam mais interessados em créditos de restauração, ligados à biodiversidade? Lansing defende que a abordagem da gestora garante perfis complementares. 

“As florestas plantadas [de espécies comerciais] crescem muito rápido, o que significa sequestrar carbono muito rapidamente. Elas são uma fábrica de sequestrar carbono”, diz. 

“Pode até haver mais biodiversidade na parte de restauração, mas é a combinação que torna nossa proposta atrativa. Estamos falando de áreas que antes eram improdutivas, grandes pastos.” 

Na ponta

Outra aposta do TIG é no chamado downstream da cadeia, no beneficiamento que pode dar novos usos à madeira que vem das suas terras.

“Nós somos parte da bioeconomia circular, substituímos concreto, plástico, vidro”, aponta. 

Ele diz que não há nenhum investimento em vista no momento, mas cita o exemplo do que vem sendo feito dentro dos ativos que a TIG já tem em casa. 

A uruguaia Lumin, que tem terras e fábricas de beneficiamento e foi comprada por um consórcio liderado pela TIG em 2017, tem como um dos carros-chefe um tipo de folha de madeira feita a partir de pinus e eucalipto e que imita os veios e a padronagem de árvores tidas como mais sofisticadas. 

“É o que chamamos de ‘painéis de substituição tropical’. Em vez de tirar árvores da Amazônia ou madeiras tropicais de forma geral, é possível fazer móveis e outras aplicações usando eucalipto”, diz.