O Bradesco anunciou R$ 250 bi para crédito sustentável até 2025. O que isso quer dizer na prática?

O Bradesco anunciou R$ 250 bi para crédito sustentável até 2025. O que isso quer dizer na prática?
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Na teleconferência de resultados da semana passada, o CEO do Bradesco, Octavio de Larazi Jr., anunciou que o banco pretende conceder R$ 250 bilhões em crédito para negócios sustentáveis até 2025. 

A cifra impressiona à primeira vista. Mas o que isso quer dizer na prática?

O que o banco define como sustentável? Quais os critérios para concessão? E os compromissos para setores controversos?

O Reset conversou com o CFO do banco, Oswaldo Tadeu Fernandes, e com o gerente de sustentabilidade, Guilherme de Melo Silva, e destrinchou o que está por trás da meta. 

Como o banco define o que é crédito sustentável?

O Bradesco está usando a nova taxonomia publicada recentemente pela Febraban para enquadrar as operações que chama de sustentáveis. Entram aqui tanto operações verdes, para biocombustíveis, por exemplo, quanto aquelas para setores como saúde e educação, enquadradas como ‘sociais’. 

As caixinhas da classificação são bastante abrangentes e permitem que uma operação do ‘business as usual’ dos bancos, como um financiamento a um hospital de luxo, seja enquadrada como sustentável simplesmente por estar no segmento de ‘saúde’.

Embora a nova metodologia da federação tenha importantes avanços,  também traz limitações, principalmente pelo fato de se basear nessa abordagem setorial, sem maior granularidade sobre o real impacto social ou ambiental. Por exemplo: inclui todos os financiamentos para projetos de  geração de energia como verdes, ainda que sejam de fontes sujas.

O gerente de sustentabilidade do Bradesco diz que, nesse caso específico, o banco adota como critério interno incluir apenas crédito dado para fontes de energia limpas. Sempre que existe uma zona cinzenta, diz Silva, o banco adota uma postura conservadora e exclui a operação da classificação como sustentável.

O que tem dentro da meta?

O objetivo do banco é incluir três tipos de operações. Entram créditos concedidos a grandes empresas e também operações de captação no mercado de capitais, como emissões de títulos sustentáveis coordenados pelo banco.  

Além disso, a meta inclui produtos de prateleira, ou seja, financiamentos concedidos para pessoas físicas e pequenas e médias empresas, como financiamento para compra de carros elétricos ou veículos adaptados para deficientes físicos, crédito para compra de painéis solares ou linhas de crédito educacional.

“Mas a maior parte será de crédito nosso, no banco de atacado. Uma parte pequena será de mercado de capitais. Não vejo esse tipo de emissão somando mais de R$ 5 bilhões por ano. Esse mercado de títulos sustentáveis vem crescendo, mas ainda é pequeno e concorremos com os outros bancos pelas operações”, diz Fernandes.

Quanto aos produtos de prateleira, a representatividade ainda é tímida e o avanço depende do trabalho de treinamento e engajamento dos gerentes, que está começando a ser feito. “Temos convicção de que, se não colocarmos o gerente na ponta com essa missão, não adianta ter meta.”

A qualidade do cumprimento da meta será acompanhada bimestralmente pelo comitê de sustentabilidade do banco, do qual fazem parte alguns dos conselheiros de administração, inclusive o chairman, Luiz Carlos Trabuco.

R$ 250 bi é um avanço?

É difícil precisar. Como o Bradesco não informa quanto vinha desembolsando nos anos anteriores para negócios com foco ambiental ou social, não é possível afirmar se há um avanço e se é representativo. Mas o banco vai começar a reportar anualmente a evolução, já a partir de 2021.

A meta se refere a novos desembolsos feitos pelo banco, ou seja, significa dinheiro novo que o Bradesco pretende destinar no período. A ideia é atingir o volume global até  2025, o que pressupõe uma média anual de R$ 50 bilhões —  embora não existam metas ano a ano.

Hoje a carteira de crédito do banco para grandes empresas está em R$ 250 bilhões, portanto os desembolsos (fluxos) anuais de R$ 50 bilhões representam 20% da carteira (estoque) do banco para o segmento.

De onde virá o dinheiro?

Em dezembro, o Bradesco emitiu uma letra financeira verde de R$ 1,2 bilhão, no primeiro ‘green bond’ de um dos grandes bancos privados do país e estuda outras oportunidades.

“Mas esses R$ 50 bilhões para crédito sustentável não estão amarrados à nossa letra financeira climática”, diz  Fernandes. Ou seja, o banco vai usar sua base de captação tradicional como funding.

O banco pretende ter meta para descarbonizar seu portfólio?

Enquanto muitos bancos americanos e europeus têm anunciado metas de tornar seus portfólios de crédito neutros em carbono, no Brasil nenhum banco assumiu esse compromisso ainda. 

“Temos discutido esse assunto reunião sim, reunião não do comitê de sustentabilidade”, diz Fernandes. “Mas temos um grande problema hoje que é mensurar as emissões do portfólio de forma correta.”

Segundo Silva, o banco vem se esforçando para fazer essa medição. Em setembro do ano passado, foi o primeiro do país a aderir ao Partnership for Carbon Accouting Financials (Pcaf), colaboração internacional entre bancos, investidores e gestores de fundos para desenvolver uma metodologia para mensurar e divulgar as emissões de carbono geradas pelas atividades financiadas. 

O banco veta operações em setores controversos?

O banco não se compromete em vetar créditos a setores controversos, como o de óleo e gás, por exemplo.

Como de praxe entre os bancos, em suas políticas socioambientais o Bradesco proíbe empréstimos a empresas com episódios de trabalho escravo ou infantil ou que comprovadamente tenham desmatado ilegalmente áreas de mata nativa.

“Num futuro não muito distante, muitos dos nossos clientes terão que se ajustar às exigências da sustentabilidade. É algo evolutivo”, diz Fernandes.

Por ora, exemplifica ele, o banco está subindo a régua no crédito para frigoríficos, vetando aqueles que desmatam também legalmente no bioma amazônico.

Segundo Silva, o banco tem se engajado com clientes para fazer a transição para uma economia de baixo carbono, buscando financiar projetos que reduzam emissões de suas atividades.