Num dos maiores family offices do Brasil, a fórmula para integrar ESG e impacto

Num dos maiores family offices do Brasil, a fórmula para integrar ESG e impacto
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Cinco anos atrás, Roberta Goulart conduzia seu trabalho habitual de preparar as novas gerações das famílias clientes de um dos maiores multi-family offices do país quando algo novo apareceu no radar. 

Aqui e ali, começaram a pipocar demandas de jovens herdeiros curiosos para saber se a casa avaliava a cadeia de produção de uma empresa ao colocar suas ações no portfólio de investimentos ou se um setor altamente poluente era considerado apto a receber recursos.

Essa foi a faísca para que o Turim Multi-family Office, que maneja algumas dezenas de bilhões de reais, começasse a trilhar o caminho de integrar os fatores ESG à carteira da abastada clientela.

Depois de um périplo pelo exterior para conhecer o que já se fazia em ESG e impacto em outros países, Goulart trouxe insights na bagagem que começaram a ser implementados.

Passados cinco anos, a casa desenvolveu um sistema que escaneia uma gama de impactos socioambientais dos investimentos de todas as 70 famílias clientes e coloca as informações preto no branco, num relatório. Além disso, acaba de fazer o primeiro fechamento de um fundo criado com a intenção de fazer investimentos com impacto positivo, principalmente no exterior. 

“O que nós estamos fazendo é um empoderamento dessas famílias como investidoras e esse processo é ainda mais rico porque inclui diversas gerações.  Queremos mostrar como é possível, sem abrir mão da relação risco e retorno, alocar o capital de maneira mais responsável”, diz Goulart, que é sócia da Turim.

Lançado um ano atrás, o TFO Purpose tem sob custódia aproximadamente US$ 20 milhões e busca ativos geograficamente distribuídos, dando prioridade a aportar recursos em fundos de venture capital, mas também investindo diretamente em alguns negócios.

Até agora, já fez quatro investimentos: na Qadria Capital, gestora de fundos do setor de saúde do Sudeste Asiático; no Owl Ventures, um fundo americano de tecnologia na educação; na Pontifax, gestora israelense que busca agritechs e foodtechs; além de um co-investimento na Fazenda Futuro, startup brasileira dedicada a proteínas à base de plantas. 

A seleção inicial dos ativos potenciais é feita pela americana Flat World, cuja especialidade é assessorar investidores, fundações e family offices na busca de ativos e construção de portfólios de impacto. A decisão final de investimento é tomada pela equipe da Turim.

Segundo Goulart, a Turim tem vários outros investimentos de impacto positivo em sua carteira de ativos ilíquidos, em áreas como smart transportation, proteína alternativa e biotecnologia, que elevam a cifra dedicada a impacto a mais de US$ 60 milhões até agora, de cerca de 25 famílias no total.

Alguns clientes têm direcionado recursos para fundos de impacto no Brasil, como a Positive Ventures, mas ainda numa escala menor do que os aportes destinados ao exterior. “No Brasil é mais direcionado aos clientes já mais sensibilizados pelo tema e é algo que tem sido feito cliente a cliente, gestor a gestor”, diz ela.

Ingrediente ‘X’

Se a sensibilização de clientes é a base de todo o trabalho que a Turim vem fazendo, o ingrediente secreto é o raio-x da carteira dos clientes sob a ótica da sustentabilidade.

Quem faz isso para a Turim é a YvesBlue, especializada em mapear e consolidar informações como pegada de carbono e alinhamentos aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da ONU para toda a carteira de ativos públicos.

“Nossa provocação é educativa. Não podemos achar que o investidor que quer ter a carteira dentro dos preceitos de investimento responsável saiba o caminho”, diz Goulart.

Cada família recebe o seu relatório e consegue saber exatamente onde está e, a partir daí, discutir caminhos.

“Na questão das emissões de CO2, por exemplo, é possível ver como está a pegada de carbono do portfólio em relação às metas do Acordo de Paris e discutir se o caminho é fazer a neutralização imediata das emissões via compra de créditos de carbono ou desinvestir ou investir em soluções de descarbonização via venture capital, por exemplo”, diz ela.

A receptividade e o interesse por investimentos mais responsáveis varia de cliente para cliente — e existem muitos que ainda consideram que a filantropia encerra a questão. Mas é um processo evolutivo, avalia ela.

A produção de relatórios tão assertivos teve um outro efeito: ajudou a sensibilizar também os gestores dos portfólios. “Começou a abrir a cabeça da nossa mesa e nos levou à fase em que estamos agora, de incorporar em todo o processo de análise de investimentos os critérios ESG. Num primeiro momento com uma abordagem de ‘risk awareness’, mas com a ideia de, no futuro, buscar oportunidades.”

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