JGP alerta sobre selos verdes e põe impacto na ponta do lápis em fundo de crédito ESG

De olho em retorno com impacto, gestora vai além do mercado tradicional e parte para a originação de emissões de pequenas e médias empresas

JGP alerta sobre selos verdes e põe impacto na ponta do lápis em fundo de crédito ESG
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(Atualizado em 6/10 pra incluir o posicionamento da consultoria Resultante)

Prestes a completar um ano de seu primeiro fundo de crédito ESG, a JGP publicou uma ampla carta aos cotistas fazendo um balanço da experiência e trazendo à luz o que considera um dos principais problemas na evolução do mercado local: o uso ‘oportunístico’ dos selos sociais e ambientais.

“As consultorias de certificação ESG (por muitas vezes recém-criadas) usam critérios e métodos de aferição de performance demasiadamente complacentes, aumentando a importância do engajamento e interação da comunidade investidora para restauração das melhores práticas internacionais ligadas às emissões ESG”, aponta a gestora no documento. 

A asset usou dois exemplos de emissões rotuladas que, em sua avaliação, falharam em demonstrar que são capazes de contribuir para avanços sociais e ambientais relevantes: uma emissão de R$ 1 bilhão em sustainability-linked bonds (SLB) da Via Varejo, feita em maio deste ano, e um CRA verde de R$ 480 milhões da beneficiadora de grãos SLC Agrícola, emitido no fim de 2020. 

Na Via, os juros da emissão estavam condicionados ao aumento do percentual de uso de energia renovável nas lojas, centros de distribuição e fábrica — um indicador que pode ter grande relevância para indústrias intensivas em energia, mas é pouco material para a atividade de varejo, aponta a JGP. 

“No caso da Via, acreditamos que as implicações dessas falhas vão além da simples inadequação dos critérios. Tendo sido a primeira oferta efetivamente pública de um SLB no país, entendemos que pode ser especialmente prejudicial à imagem e à percepção dos agentes econômicos acerca da certificação recém-explorada no país”, escrevem os gestores.

No caso dos green bonds da SLC, a principal crítica da gestora é que nem o parecer de segunda opinião, nem as interações com a companhia deixaram claro qual seria efetivamente o destino dos recursos captados, uma das premissas básicas dos títulos verdes — definidas nos princípios criados pela ICMA, uma espécie de Anbima global, que autorregula o mercado de capitais.

Ambos os títulos citados no relatório tiveram parecer de segunda opinião da Resultante. 

Num mercado em que o ESG ainda está em sua primeira infância, é natural que haja um processo de depuração e amadurecimento, afirma Alexandre Muller, sócio da JGP responsável pela área de crédito. Mas é preciso que os investidores institucionais assumam um papel ativo em desenhar as linhas para as melhores práticas.

“Temos essa responsabilidade de ser um formador de opinião e vamos exercê-la a partir de um critério de que não abrimos mão, que é o que tem de melhor lá fora. Não relativizamos ESG: ou usamos o melhor critério disponível, ou não usamos”, diz ele.

Na carta, a gestora traz também exemplos positivos de emissões rotuladas, como uma captação de US$ 1,1 bilhão em bônus sustentáveis do Mercado Livre feita no começo do ano. E traz estudos de caso sobre papéis que entraram na carteira, como um green bond de US$ 600 milhões da FS Bioenergia, de etanol de milho, e um CRA verde de R$ 25 milhões da Fazenda da Toca, que produz ovos orgânicos. 

Em nota ao Reset, a CEO da Resultante Maria Eugênia Buosi afirmou que “é natural que o tema de integração ESG no crédito privado, por ser recente no mercado de capitais, possa gerar divergências de percepção entre investidores”. Mas que no caso das duas operações citadas na carta Pública da JGP reforça que “todas as medidas para elaboração do parecer de segunda opinião foram embasadas tecnicamente nas principais referências acadêmicas e de mercado no que tange à materialidade e ambição das metas e uso de recursos avaliados.” (Veja a íntegra do posicionamento no fim da reportagem)

Originação própria

Lançado em novembro de 2020, o JGP Crédito ESG, que tem cerca de R$ 54 milhões de patrimônio, investiu em papéis de 25 empresas que atuam no Brasil e na América Latina. Na lista, constam títulos de grandes empresas como Natura, Klabin, Sabesp, Rede D’Or, Omega Energia e AES Tietê. 

Mas, mais do que carimbos ESG, o que a JGP busca no fundo dedicado são empresas e papéis cuja alocação dos recursos é efetivamente capaz de gerar impactos socioambientais positivos, sempre associado à rentabilidade.

Nesse sentido, a gestora concluiu que precisaria ir além para ajudar a originar produtos voltados para pequenas e médias empresas — que hoje não encontram espaço no mercado tradicional. 

A JGP participou da estruturação de uma debênture de R$ 7 milhões da Kompass, de energia solar, e de outra, de R$ 55 milhões, da RZK Biogás, que gera energia a partir do gás de aterros sanitários. 

“Estamos num momento de transição do capitalismo e sabemos que os negócios que mais vão gerar impacto são fast growing companies, mas que ainda são pequenos. Se ficarmos somente nos ativos já tradicionais, eles não vão crescer tão rápido, pelo contrário — ainda vão pegar um pouco da inflação verde antes de ter o prêmio verde, do crescimento”, aponta José Pugas, head de ESG da JGP Crédito. 

Na ponta do lápis

Essa estratégia é amparada pelo esforço da gestora em mensurar o retorno de impacto dos investimentos, que se soma à camada de retorno financeiro. 

A principal métrica utilizada pela companhia é a de reais por tonelada de CO2 evitado. A lógica é: quanto menor o valor financeiro investido por tonelada de CO2 evitada, maior o retorno ambiental do ativo. As emissões de RZK e Kompass Energia, apesar de terem um volume menor, foram as que atingiram os melhores resultados nesse sentido na carteira do JGP Crédito ESG. 

No caso da geradora de energia a partir do biogás, cada R$ 184,57 investidos na emissão evitam a emissão de uma tonelada de carbono. Já na da Kompass, de solar, esse valor é de R$ 1246,43, enquanto numa debênture da AES Tietê, salta para R$ 8573,46. 

As contas são feitas a partir de pareceres de segunda opinião, relatórios de acompanhamento de impacto pós-emissão e inventários de emissões de gases de efeito-estufa, sempre com auditoria independente.

As métricas de avaliação de impacto da carteira vão além do retorno climático, e levam em consideração também o acesso a educação, como do caso da Provi, de financiamento estudantil para baixa e média renda, e efluentes tratados, quando se trata de saneamento.

Mas a métrica de eficiência para evitar emissão de carbono é mais padronizável e comparativa e deve ajudar a balizar o compromisso da JGP de tornar seu portfólio neutro em carbono até 2040, assumido junto à Net Zero Asset Managers (NZAM). 

“Sempre havia a pergunta: como tomar a decisão de alocação num ativo para ter a gestão de portfólio orientada ao clima. Esse é o indicador que vai padronizar nosso plano de descarbonização”, aponta Pugas. 

Desde o lançamento, o JGP Crédito rende 6,7% contra 2,8% do CDI.

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Posicionamento da Resultante

É natural que o tema de integração ESG no crédito privado, por ser recente no mercado de capitais, possa gerar divergências de percepção entre investidores.

No caso das duas operações citadas na Carta Pública da JGP, no entanto, reforçamos que todas as medidas para elaboração do parecer de segunda opinião foram embasadas tecnicamente nas principais referências acadêmicas e de mercado no que tange à materialidade e ambição das metas e uso de recursos avaliados.

Além da ICMA e CBI, foram adotados adicionalmente outros padrões internacionalmente reconhecidos pela importância na formulação e divulgação de métricas de sustentabilidade.

No caso da Via, a meta de transição energética é considerada material por iniciativas como SASB e a GRI, além de ter sido feito um estudo de mercado que compara as ambições de todas as empresas do varejo brasileiro que possuem metas de uso de energias renováveis em suas operações.

Não obstante, uma parcela significativa do consumo de energia da Via diz respeito à sua operação industrial de móveis, sendo o uso de energia um tema indiscutivelmente relevante para este setor.

Especialmente considerando o momento de crise energética atual, em que aumenta o uso de energia térmica no Sistema Integrado Nacional, a transição para energias renováveis se apresenta como um tema de grande relevância para diferentes setores da economia, inclusive a indústria, logística e varejo.

No relatório de segunda opinião da operação de SLC, publicamente disponível neste link, consta nas páginas 32 e 33 uma tabela que relaciona os argumentos que justificam o enquadramento em cada seção dos Green Bonds Principles.

Os recursos da operação, cujo uso será verificado em relatórios de monitoramento, tem como objetivo a compra de equipamentos mais eficientes e que resultarão na redução de emissões de gases de efeito estufa pela companhia.

A Resultante adotou, inclusive, como critério para fornecimento do SPO, a análise dos fornecedores dos equipamentos a serem adquiridos, além das práticas de gestão do emissor em relação às questões ambientais, sociais e de governança corporativa.Somos reconhecidos pela senioridade de nossos profissionais e pelo alto embasamento técnico de nossos trabalhos.

Temos oito anos de mercado como consultoria e um time sênior em que todos possuem mais de 15 anos de experiência na agenda de finanças sustentáveis, em suas diversas frentes de atuação. Reforçamos nosso compromisso com a qualidade técnica de nossas entregas e aderência às principais referências internacionais neste mercado, e colocamo-nos à disposição para quaisquer esclarecimentos adicionais em relação a estes ou outros pareceres fornecidos pelo nosso time.

Maria Eugênia Buosi, CEO da Resultante ESG