Gargalo à frente na indústria eólica

Brasil bate recorde em nova capacidade instalada, mas oferta de equipamentos pode limitar avanço no mundo, aponta conselho global do setor

Gargalo à frente na indústria eólica
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A despeito de um baixo crescimento da economia, o Brasil bateu recorde de instalações de energia eólica em terra (onshore) pelo segundo ano consecutivo em 2022, ficando atrás apenas da China e dos Estados Unidos em nova capacidade. 

Foram adicionados 4 GW em geração, contra 3,5 GW em 2021, de acordo com o relatório anual divulgado hoje pelo Conselho Global de Energia Eólica (GWEC, na sigla em inglês).

O país continuou em sexto lugar no ranking global de capacidade total instalada, atrás de China (40%), Estados Unidos (17%), Alemanha (7%), Índia (5%) e Espanha (4%). 

A expectativa da GWEC é que o Brasil mantenha o ritmo de expansão no próximo quadriênio, adicionando 16 GW até 2027. 

A curva, no entanto, será mais lenta do que o avanço previsto para o restante do mundo. No mundo, a estimativa é uma adição de 680 GW até 2027, ou 136 GW por ano — uma taxa de crescimento anual de 15%. 

Com uma demanda crescente por energia limpa e os pacotes climáticos multibilionários anunciados por Estados Unidos e União Europeia, o temor do setor está por conta dos gargalos na cadeia produtiva. 

Na avaliação do GWEC, pode haver desaceleração de novas instalações por falta de componentes essenciais, como pás e geradores já em 2026. 

Hoje, a China domina sozinha 70% do mercado de alguns componentes, como as torres – e tensões geopolíticas podem impactar as negociações de fornecimento. 

Além disso, pressões de custos têm pesado sobre muitos fabricantes globais. 

“Muitos dos fabricantes no centro da indústria viram perdas financeiras crescentes causadas pela corrida por preços mais baixos, como resultado de políticas governamentais equivocadas em relação a acordos de aquisição e venda, exacerbados pela inflação mais alta e pelos custos de logística”, destacou o GWEC em relatório. 

Tanto americanos quanto europeus estão dando incentivos à produção local, mas o aumento da oferta de equipamentos não vai conseguir acompanhar o avanço da demanda, ao menos num primeiro momento, aponta o GWEC. 

Paradoxo

Enquanto o mundo apresenta uma demanda crescente por turbinas, no Brasil, as fábricas estão deixando de produzir, em meio a uma economia estagnada – que significa menos necessidade de energia à frente – e a disparada nos custos com matérias-primas.

Há duas semanas, a Siemens Gamesa anunciou que iria paralisar temporariamente sua fábrica em Camaçari, na Bahia. A decisão veio cerca de seis meses depois da GE Renewable Energy informar a suspensão na produção de turbinas eólicas no Brasil. 

Com apenas outras quatro fabricantes de aerogeradores em território nacional, liquidez limitada e cenário alto de juros, cresce a preocupação com uma pressão de preços no setor. 

A presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica), Elbia Gannoum, afirma que é preciso uma política forte em renováveis, especialmente em novos setores emergentes.

“Não dá pra fazer uma transição energética justa sem o forte papel do Estado”, disse ela em evento realizado hoje em São Paulo. “O governo não precisa colocar a mão no bolso para fazer uma política industrial energética. Só precisa criar um ambiente amigável para atrair investimentos. E isso precisa ser feito com aparatos regulatórios.”

Longo prazo

Apesar dos desafios de médio prazo do setor, a previsão da GWEC é que, já na metade deste ano, o setor eólico vai alcançar a marca simbólica de 1TW em operação e a expectativa é atingir o dobro disso até 2030. 

“Foram cerca de 40 anos para chegar aqui. No entanto, o próximo TW levará menos de uma década”, disse o presidente da GWEC, Ben Backwell,em evento promovido pela Abeeólica na segunda-feira em São Paulo. 

“As políticas de energia e clima que estão sendo seguidas pelas maiores economias do mundo, tanto no Ocidente quanto no Sul Global, apontam para um novo nível de ambição e apoio à energia eólica e renovável”, escreveu o executivo no relatório. 

Gannoum e Backwell partem para Brasília na quarta-feira, 29. Em reuniões previstas com congressistas, questões ligadas ao desenvolvimento da eólica offshore devem ser um dos temas centrais.

(Colaborou Natalia Viri)