Fundo Vale e KPTL querem R$ 200 milhões para 'destravar o reflorestamento'

Objetivo do fundo de capital de risco de impacto é derrubar obstáculos para a recuperação de florestas e o avanço da agricultura regenerativa

Paulo Tomazela (à esquerda), da KPTL, e Gustavo Luz, do Fundo Vale
Paulo Tomazela (à direita), da KPTL, e Gustavo Luz, do Fundo Vale
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O Fundo Vale, braço filantrópico da mineradora homônima, e a gestora de capital de risco KPTL lançam nesta quinta-feira (2) um fundo de investimento de impacto que vai destinar R$ 200 milhões a startups que apresentem soluções inovadoras para um problema mais que urgente do país: o reflorestamento.

Mas o objetivo não é encontrar quem plante árvores de maneira mais eficiente, diz Renato Ramalho, sócio e CEO da KPTL: “A ideia é buscar empresas que ofereçam soluções para destravar gargalos na agenda do reflorestamento”.

Batizado de Fundo de Floresta e Clima, o fundo quer ter entre 25 e 35 startups no portfólio nos próximos cinco anos. A duração total do fundo prevista é de dez anos, podendo ser estendida por mais dois.

“Estamos buscando empresas com caráter inovador, de base tecnológica, com relação próxima com a agenda de reflorestamento, atuando no campo da bioeconomia, recuperação e conservação de florestas, carbono e economia regenerativa”, afirma Ramalho.

Da criação de uma estrutura de saneamento que atenda os moradores das regiões-alvo – pois não se trata apenas de cuidar da vegetação, mas também da população que dela depende para sobreviver – a uma medição eficiente da contribuição para a descarbonização, existem muitos obstáculos que vão além do plantio de árvores.

Um sinal da complexidade da tarefa é o perfil das companhias que o fundo vai buscar. Como o ecossistema de negócios dedicados a resolver esses problemas ainda é exíguo, a KPTL vai investir em startups com boas soluções mesmo que elas ainda não tenham faturado um real.

Ideias consistentes e fundadores realistas – “sem valuations malucos” e com foco em rentabilidade, afirma Ramalho – têm chance de receber um cheque, seja em rodadas pré-seed, seed ou série A. Ainda não há definição a respeito de valores.

“Quando falamos em inovação e tecnologia, há soluções que sequer vislumbramos hoje”, diz o CEO. A flexibilidade no tamanho dos aportes é importante pois o fundo está, nas palavras de Ramalho, “aberto a descobertas”.

O incentivo certo

Os inventários florestais são um problema típico da Amazônia que poderia ser resolvido, ou pelo menos atenuado, com a ajuda da tecnologia. É por meio do inventário florestal que se determina a topografia de uma área a ser recuperada, onde estão os cursos de água, quais são as espécies de flora e fauna que vivem ali e que produtos podem ser explorados com mais eficiência.

Com essas informações, muitos pequenos proprietários rurais poderiam transformar áreas ocupadas por pastos em plantações de sistema agroflorestal, que unem agricultura e preservação da mata nativa. Mas hoje esse levantamento é inviável por causa do alto custo.

“Incentivo é a palavra chave. Como eu incentivo uma comunidade a manter a floresta em pé gerando renda? Como eu incentivo educação e qualificação dessa comunidade? Como eu incentivo o agronegócio a se converter para uma agricultura regenerativa?”, diz Danilo Zelinski, responsável pela área de floresta e clima da KPTL.

As startups que sugerirem respostas para essas perguntas são as procuradas pelo novo fundo.

Além da recuperação e preservação da floresta, algumas métricas de impacto que devem ser cumpridas vão envolver a relação entre lucratividade e o CO2 emitido e índices de qualidade de vida, afirma Zelinski.

Ainda sem nenhuma companhia no portfólio, a KPTL está fazendo um mapeamento de oportunidades. Além de consultas a investidores-anjo que atuam nas regiões-alvo, como a Amazônia, a gestora também olha a pesquisa acadêmica feita em hubs de inovação e universidades fora dos grandes centros.

“Os negócios dessa área geralmente se desenvolvem longe do centro e próximos de onde se sente o problema”, afirma Paulo Tomazela, co-fundador e gestor da KPTL (à esquerda na foto).

Em captação

Segundo Ramalho, da KPTL, o fundo ainda está em fase de captação de recursos. O objetivo é chegar ao total de R$ 200 milhões em dois anos.

Onde o Fundo Vale entra na história? Por enquanto, não há anúncios previstos sobre o tamanho da sua contribuição financeira para a nova iniciativa. Gustavo Luz (à direita na foto), o gestor responsável pelo Fundo Vale, afirma que o papel do FV é de mero co-estruturador da operação.

No entanto, uma apresentação do fundo distribuída à imprensa afirma que o Fundo Vale selecionou a KPTL em 2021 “com o objetivo de escolher parceiro que lançaria o fundo alvo de seu investimento, dando início a um processo em que mais investidores poderiam aderir”.

Criado em 2009 com vocação filantrópica, o Fundo Vale mais recentemente se voltou ao capital de risco para executar um plano ambicioso da empresa-mãe de recuperação de 100 mil hectares de matas nativas e preservação de outros 400 mil hectares. Até agora, cinco startups já receberam recursos e 5.000 hectares foram recuperados.

Mesmo sem uma cifra definida, Ramalho, da KPTL, afirma não ter dúvida de que o FV “será um investidor importante”. Além disso, o veículo da mineradora é um chamariz de peso e esteve recentemente apresentando o fundo para a Latimpacto, uma rede de investidores da região.

Entre os cotistas que já embarcaram no fundo estão a Tridon Participações, family office dos fundadores da Jacto; os empresários Denis e Ilana Minev, das Lojas Bemol; e Marco Riguzzi, empresário da área de embalagens e acionista da Farmaplast.

Também há cada vez mais interesse por parte de investidores estrangeiros. “Estamos num momento privilegiado para investimentos no Brasil. Não temos uma guerra ocorrendo no território, caso da Europa, e não somos a China, que na visão de muitos investidores faz movimentos exagerados em relação à Covid e autoritários em relação à tecnologia”, diz o CEO da KPTL.

Ao contrário do cenário interno, onde a KPTL precisa fazer um esforço quase didático para convencer as instituições a se aventurar no capital de risco de impacto, lá fora pessoas físicas e instituições privadas e públicas são mais abertas a esse tipo de investimento.

Além da KPTL e Fundo Vale, a estruturação do Fundo de Floresta e Clima também contou com a contribuição da aceleradora Troposlab e as consultorias da ONG Imaflora e da Resultante, especialista em ESG.