Fundador da Potássio do Brasil deixa um rastro de insatisfação

Comum no Canadá, o modelo de negócios de Stan Bharti foi trazido ao Brasil por Eike Batista – com consequências desastrosas

Ilustração mostra Stan Barthi com o presidente Jair Bolsonar
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“Vendemos mais de dez empresas nos últimos 15 anos e as vendemos por dez vezes o que valiam originalmente.” O autor da frase é o financista Stan Bharti, controlador da canadense Forbes & Manhattan, responsável por prospectar e desenvolver o projeto de mineração de potássio em Autazes, no coração da Amazônia.

Parte de um vídeo institucional da F&B, a afirmação ajuda a explicar como a firma opera: identifica oportunidades de exploração de recursos naturais mundo afora – especialmente em mineração –, tira do caminho eventuais obstáculos burocráticos, ambientais e financeiros e, por fim, abre seu capital ou os vende a investidores estratégicos, embolsando o lucro. 

Em outro vídeo no canal do Forbes & Manhattan no YouTube, Bharti afirma ter levantado entre US$ 2 bilhões e US$ 3 bilhões no mercado de capitais nesses mesmos 15 anos, com o modelo de negócios que é comum no Canadá e foi trazido ao Brasil, com consequências desastrosas, por Eike Batista.

Um empreendedor que já cruzou com Barthi nas rodas das junior mining companies canadenses o descreve como um sujeito ‘bem extravagante’.

Num desses vídeos é possível entender o uso do adjetivo. Usando um paletó com estampa de camuflagem, ele circula pelo escritório da F&B em Toronto exibindo quadros e esculturas e explicando quando e como os adquiriu. 

Boa parte do tempo é dedicada a falar da sua coleção de pôsteres de propaganda do Partido Comunista da antiga União Soviética na era Stálin (cujo busto em bronze completa a decoração de um dos corredores da sede da companhia, em Toronto).

O estilo extravagante se estende aos herdeiros.

Em 2014, seu filho mais velho, Julian Barthi, então com 27 anos e casado, deu um lance de 50 mil libras esterlinas por um beijo nada técnico na atriz Elizabeth Hurley num jantar beneficente em Londres, com a presença de estrelas do calibre de Elton John.

Bharti coleciona queixas de acionistas minoritários em muitas das empresas que levou à bolsa. A reclamação central, reproduzida em fóruns de investidores canadenses, é que ele e seus executivos costumam atribuir a si próprios remunerações milionárias pelos postos que ocupam nas companhias, mesmo nos períodos em que os negócios vão mal.

Numa página em que um grupo fala em votar contra a proposta de remuneração na mineradora de ferro canadense Black Iron, um investidor sentencia: “Infelizmente, se eu tivesse que identificar uma grande falha / risco em relação a esta empresa: (…) os sanguessugas associados a essa ação, ou seja, Forbes & Manhattan e Stan Bharti, que também recebe um salário quase equivalente a Matt [Simpson, o CEO da companhia], há muitos anos não faz absolutamente nada. Ele fez isso com muitas outras entidades em que tem posições de controle.”

Um outro responde: “Quantos investidores de varejo insatisfeitos das empresas Forbes & Manhattan são necessários para se criar um grupo no Reddit contra a Forbes & Manhattan?”

Na virada de 2014 para 2015, queixas do tipo se transformaram numa batalha entre acionistas da Aberdeen International, controlada por Bharti.

O investidor ativista Ryan Morris, da Meson Capital Partners, que detinha 9% da empresa, promoveu uma campanha para removê-lo da presidência do conselho, acusando-o de extrair compensação pra lá de generosas.

Nos três anos anteriores, a Aberdeen havia pagado mais de US$ 10 milhões em salários, bônus e outros incentivos ao chairman e a outros dois executivos associados a ele, enquanto registrava mais de US$ 84 milhões em perdas e via suas ações mergulharem na Bolsa de Toronto.

Não é de hoje que Bharti e seu Forbes & Manhattan fazem negócios no Brasil.

Em 2011, uma reportagem do jornal Brasil Econômico, que hoje não existe mais, noticiava a abertura de um escritório em Belo Horizonte sob o título “Grupo Forbes & Manhattan chega com tudo ao Brasil”. 

O plano, descrevia o texto, era “disputar blocos de petróleo com HRT, OGX e Shell, rivalizar em óleo de xisto com a Petrobras e com a Vale em projetos de potássio e fosfato – insumos usados para fabricar fertilizantes”.

Mesmo antes da abertura do escritório o grupo já se movia em terras brasileiras, inclusive em torno do potássio amazônico.

Seus outros negócios no país são cercados de controvérsias

Em novembro do ano passado, por exemplo, o F&B comprou da Petrobras sua unidade de industrialização do xisto por US$ 33 milhões. Como mostrou recente reportagem da Pública, dez anos antes, uma comissão interna de apuração da Petrobras havia investigado um possível vazamento de informações sigilosas para a F&M ligadas a um projeto de internacionalização na área de xisto. Futuros contratos com a empresa ou qualquer companhia a ela associada foram considerados “desaconselháveis”.

Barthi também está por trás do desenvolvimento do projeto da mineradora Belo Sun, que quer criar a maior mina de ouro a céu aberto do Brasil, no Estado do Pará.

Mais uma vez, a polêmica reside no fato de que a exploração se dará em território de floresta, na chamada Volta Grande do Xingu, uma curva de rio de 100 quilômetros que banha terras indígenas e é ocupada por centenas de famílias ribeirinhas.

A região fica próxima a Altamira, que sofre as dramáticas consequências socioambientais decorrentes da instalação da hidrelétrica de Belo Monte e é tido hoje como o segundo município mais violento do Brasil.

Assim como no Projeto Autazes, o Ministério Público Federal denunciou a ausência de consulta prévia aos povos indígenas dos territórios afetados e também pediu que o licenciamento ambiental seja feito na esfera federal, e não na estadual. 

Com toda a confusão, comenta-se que Bharti já teria batido em retirada e vendido a maior parte de suas ações no projeto.