O ESG está com os dias contados? A McKinsey diz que não

A ressaca em relação aos negócios e investimentos sustentáveis é passageira, argumenta a consultoria

Ilustração com dobraduras mostra um barquinho de papel prestes a ser atingido por uma onda
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Algum tipo de reação negativa era esperada dado o hype em torno das letras ESG – sigla em inglês que se refere a fatores ambientais, sociais e de governança – no mundo dos negócios e dos investimentos nos últimos dois a três anos.

Mas a violenta ressaca vista nos últimos meses (incluindo uma série de reportagens estampada na capa da influente The Economist) pegou muita gente de surpresa.

A crise energética mundial, os dilemas trazidos pela guerra da Ucrânia e uma performance de alguns fundos sustentáveis ainda inferior à do restante do mercado levaram muita gente a questionar: seria o ESG uma moda passageira?

Num paper publicado nos últimos dias, consultores da McKinsey & Co. argumentam que não, pelo contrário.

O texto, intitulado “Does ESG really matter – and why?” (o ESG realmente importa – e por quê?), afirma que as críticas são compreensíveis e os questionamentos, válidos, mas os princípios essenciais que sustentam o movimento não só continuam relevantes como serão cada vez mais importantes.

Os autores concentram a análise nos méritos do ESG do ponto de vista das empresas e da gestão, mas observam de saída que um dos flancos dos defensores da sustentabilidade é o desempenho nos mercados.

O dinheiro destinado aos ativos sustentáveis, estimados em US$ 2,5 trilhões hoje, caiu 13% em relação ao dado do fim do primeiro trimestre do ano passado.

O custo humano, geopolítico e econômico da guerra no Leste Europeu também contribuiu para a mudança de humor em relação ao tema.

Ideias até então dogmáticas entre certos defensores dos investimentos sustentáveis, como a exclusão automática do setor de defesa , passaram a ser reavaliadas por gestores.

E a crise energética causada pelo conflito levou muitos países europeus a reconsiderar os planos de abandonar usinas nucleares ou que queimam carvão – ao mesmo tempo em que ressaltou a urgência da transição para o mundo pós-carbono.

Mas todas essas são turbulências passageiras, argumentam os consultores da McKinsey.

Adeus, ESG?

Antes de 2005, quando o termo ESG foi cunhado, falava-se em responsabilidade social corporativa.

O nome pode mudar de novo ou sumir, mas a “licença social, ou seja, a percepção de stakeholders que uma empresa ou setor esteja agindo de forma justa, adequada e merecedora de confiança”, continuará relevante, diz o paper da McKinsey.

“O que alguns críticos desconsideram é que uma condição para o valor de longo prazo é administrar, e lidar com, externalidades massivas, que mudam paradigmas”, escrevem os autores.

O principal exemplo disso, claro, é o clima. Para muitos negócios não há como imaginar que as coisas sigam sendo feitas da mesma maneira quando se fala em mudança climática catastrófica.

Por esse motivo, essa “licença social” é dinâmica. O artigo faz uma analogia com o mercado de capitais:

“O capital social é análogo ao capital obtido por meio de dívidas ou venda de participações – quem o concede olha para os resultados passados, porém está mais interessado nas perspectivas de médio e longo prazo. Mas, diferentemente do capital tradicional, em que muitas vezes existem alternativas financeiras criativas, não existem alternativas para as empresas que não superarem a barra estabelecida pela sociedade.”

Essa exigência também pode ser colocada por reguladores. Mais cedo ou mais tarde, com maior ou menor rigor, ela deve ser realidade em todo o mundo.

Muitas empresas, especialmente as multinacionais, não podem se dar ao luxo de esperar para ver. “Pelo contrário, seus stakeholders esperam que elas se envolvam desde já na evolução dos cenários regulatório e, em termos mais amplos, social.”

A Securities and Exchange Commission (SEC), que regula os mercados de capitais americanos, já anunciou uma proposta para tornar obrigatórios os reportes específicos sobre o impacto ambiental dos negócios.

E mais de 90% das organizações que pertencem ao índice S&P 500 (da bolsa de Nova York) e cerca de 70% das que estão no Russell 1000 (da bolsa de Londres) já fazem algum tipo de divulgação ESG.

O problema das métricas

Embora as divulgações sejam cada vez mais frequentes e abrangentes, o tema da medição ESG ainda é um “trabalho em andamento”.

O texto aponta que os scores de crédito apurados por agências como Moody’s e S&P para uma determinada companhia apresentam correlação de 99%. Já a coincidência dos scores ESG de seis provedores diferentes pode variar de 38% a 71%.

Mas é importante ter duas coisas em mente, afirmam os autores. Primeiro, há um esforço para consolidação dos padrões e das regras de divulgação.

Talvez mais importante, isso toma tempo.

“As regras contábeis que conhecemos hoje não se materializaram prontas”, diz o texto. “Elas são o resultado de uma longa evolução e de debates intensos.” Mesmo depois de estabelecidas, essas regras seguem em constante aperfeiçoamento. O mesmo será verdade para os padrões e medidas ESG.

O caminho para que as companhias internalizem critérios ambientais, sociais e de governança é acidentado, mas isso não pode ser justificativa para uma atitude passiva, afirmam os autores.

“As empresas não podem simplesmente esperar que as coisas se ajeitem. Toda empresa tem um propósito implícito – uma razão de existir que responda à pergunta: ‘O que o mundo perderia se essa empresa sumisse?’”

A Natura é mencionada como um negócio que direciona seus esforços ESG para proteção da Amazônia, a defesa dos direitos humanos e a circularidade.

“Acreditamos que a importância das ideias [fundamentais do ESG] não estejam prestes a entrar em declínio; na realidade, o imperativo para que as companhias conquistem sua licença social parece ser crescente”, conclui o paper.