Desastres como o da Califórnia podem desencadear uma crise financeira. E desta vez não são os ativistas que dizem

Relatório encomendado pela Commodity Futures Trading Commission americana aponta os riscos que a mudança climática impõe à economia

Desastres como o da Califórnia podem desencadear uma crise financeira. E desta vez não são os ativistas que dizem
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Os grandes incêndios que devastam a Califórnia, tingindo de laranja o céu de cidades como São Francisco, podem ser uma das fagulhas de uma crise financeira provocada pela mudança climática.

A conclusão está num relatório divulgado ontem e que poderia ser apenas mais um entre outros que alertam para os crescentes riscos de crises financeiras e econômicas de grandes proporções provocadas pelas mudanças climáticas.

A diferença é que pela primeira vez um trabalho dessa natureza foi feito sob o guarda-chuva de um regulador financeiro dos Estados Unidos.

O relatório foi encomendado pela Commodity Futures Trading Commission e elaborado por um painel de 35 membros, incluindo representantes dos bancos Citigroup, Goldman Sachs e Morgan Stanley, da agência de risco S&P, da seguradora Marsh & McLennan, além de grandes produtoras de petróleo e gestores de fundos.

“As mudanças climáticas representam um grande risco para a estabilidade do sistema financeiro dos EUA e para sua capacidade de sustentar a economia americana”, afirma o texto.

Segundo o relatório, a mudança climática está tornando frequentes os desastres naturais que até agora eram classificados por economistas como choques pontuais.

E danos inicialmente regionais, como a queda dos preços das casas e a paralisia da indústria do turismo, podem provocar um efeito dominó, incluindo uma onda de calotes e outras disrupções no mercado, com potencial de enfraquecer a economia dos Estados Unidos e iniciar uma crise.

“Uma revisão repentina das percepções dos participantes do mercado sobre o risco climático poderia desencadear uma reprecificação desordenada de ativos, o que poderia ter efeitos em cascata sobre carteiras e balanços e, portanto, implicações sistêmicas para a estabilidade financeira”, diz o relatório.

Big fires everywhere

A agência de combate a incêndios da Califórnia estima que cerca de 3 milhões das 12 milhões de residências do Estado estão sob alto risco de incêndios florestais. Um risco que começa a se tornar alto demais para ser segurado.

Em 2018, depois da maior temporada de incêndios em termos de prejuízos materiais e mortes, muitas seguradoras já se recusaram a renovar apólices, por exemplo.

“Você pode contar a mesma história em termos de aumento do nível do mar, inundações e tempestades mais intensas e seu impacto no valor dos imóveis residenciais”, disse à Reuters Dave Jones, um ex-comissário de seguros da Califórnia que é membro do painel que elaborou o relatório.

Jones, que agora integra a Nature Conservancy, chamou o relatório de uma análise ‘abrangente’ dos riscos para todos os mercados financeiros.

Hora de agir

Depois de alertar que a mudança climática já impacta ou irá impactar todas as facetas da economia americana, incluindo infraestrutura, agricultura, propriedades residenciais e comerciais, bem como saúde humana e produtividade do trabalho, o relatório lista uma série de recomendações às autoridades financeiras do país.

A primeira delas é que todos os reguladores financeiros levem em conta os princípios desenvolvidos pela Task Force on Climate-Related Financial Disclosures (TCFD), que se firmou como o padrão de mensuração e reporte de riscos climáticos.

Outra recomendação é para que os reguladores exijam das empresas listadas a divulgação de suas emissões de gases de efeito-estufa nos escopos 1 (diretas) e 2 (relativas a compra de energia). E, conforme sejam desenvolvidas métricas confiáveis para medir as emissões de escopo 3 (de clientes), sua divulgação também devem se tornar obrigatória.