Deep capta R$ 9 milhões para escalar 'big data do ESG'

Startup se pluga a sistemas de gestão das companhias para automatizar e gerar dados de impacto em tempo real

Deep capta R$ 9 milhões para escalar 'big data do ESG'
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Quem trabalha na área de sustentabilidade sabe: os dias que antecedem a entrega de um inventário de carbono ou um relatório integrado costumam ser acompanhados de muito trabalho e poucas horas de sono. 

Fundada há dois anos, a Deep quer mudar essa realidade — e acaba de receber um cheque de R$ 9 milhões, numa rodada liderada pela Fram Capital e que contou com a participação da consultoria Nint (ex-Sitawi), especializada em ESG, e do Instituto Votorantim. 

A proposta é gerar informações como emissões de carbono, consumo de água energia ou geração de resíduos de forma automática, e que conversem com as demonstrações financeiras e se adequem aos principais padrões de reporte ESG, como SASB e GRI. 

A companhia já conta com uma carteira de clientes como a Companhia Brasileira de Alumínio (CBA), a locadora de veículos Movida e a Iguá, de saneamento básico. 

“Nossa plataforma é online e totalmente integrada aos sistemas de gestão das empresas, o que possibilita uma leitura em tempo real dos fatores de impacto mais relevantes”, afirma Paulo Miranda, CFO e co-fundador da Deep. 

Miranda trabalha com o conceito de impacto desde o começo da carreira, há três décadas, quando atuou fora do Brasil em organizações multilaterais, como a Organização dos Estados Americanos (OEA) e o Banco Mundial – e sempre teve uma inquietação com o fato de os investimentos serem avaliados apenas pela lógica do retorno financeiro. 

A Deep nasceu de seu encontro com Arthur Covatti, engenheiro formado pelo Instituto de Tecnologia Aeronáutica (ITA), 30 anos mais novo e responsável pela cabeça matemática do negócio. 

Eles se conheceram em 2018 no Instituto Alpha Lumen, uma instituição do terceiro setor de São José dos Campos, que atua em educação. 

Covatti era CFO e Miranda, voluntário – e juntos entregam uma ampla avaliação de impacto do instituto. A partir do trabalho, perceberam que tinham a semente para desenvolver algo mais robusto voltado para resolver uma dor generalizada das empresas. 

“O mundo está caminhando na direção ESG. É importante criar métricas objetivas. Isso é a base para tudo, senão é só uma narrativa”, diz Cesare Rivetti, sócio da Fram Capital. “A Deep apresenta uma solução muito robusta e, o mais importante, escalável.”

Do micro para o macro 

Normalmente, a maior parte do cálculo de fatores como inventário de carbono e geração de resíduos é feita em retrospecto. Grosso modo, as empresas partem das demonstrações financeiras e usam premissas para calcular o impacto daquilo que já foi reportado. 

Há muito trabalho manual envolvido e, na prática, as mensurações acabam sempre defasadas. “Você não consegue tomar uma decisão efetiva para lidar com esses impactos se não faz isso de forma contínua, entendendo todos os dias o que está acontecendo”, pontua Miranda. 

A Deep inverteu a lógica. 

A plataforma se pluga aos sistemas de gestão das companhias, identifica “microfatos” financeiros ou não financeiros e atribui a eles o que chama de um fator de impacto, obtido pelo cruzamento de bases de dados públicas e proprietárias.  

Uma nota fiscal de compra de combustível, por exemplo, se desdobra automaticamente numa emissão de dióxido de carbono atrelada a ele.

Alguns cálculos são feitos de maneira mais precisa, a partir de uma medição física conectada diretamente ao fato gerador, mas há extrapolações que podem ser feitas a partir de bases de dados que cruzam CNPJs, CNAEs – ou, em última instância, o setor da economia a que um input está ligado. 

Ao todo, são mais de 15 mil métodos de cálculo que contemplam oito dimensões: energia, água, resíduos, emissões de carbono, geração de renda, igualdade de gênero, expectativa de vida e educação. 

Os resultados são apresentados na mesma linha das demonstrações financeiras das empresas, falando, segundo Miranda, a língua dos gestores financeiros.

“Se, do lado da conta de fretes, você põe a quantidade de CO2 ou o gasto de energia ligado àquele número, o executivo consegue abrir aquilo no detalhe e começa a entender onde está a dimensão do impacto”, diz o fundador.

Escopo 3

Além do sistema voltado para o dia a dia das empresas, a Deep tem soluções para uma das maiores dores quando o assunto é ESG: o monitoramento de fornecedores e o impacto gerado pelo uso dos produtos, ou seja, na cadeia de valor. É o que se chama de Escopo 3, quando se trata de emissões de carbono. 

Um produto chamado Deep Supply é voltado para a cadeia de fornecimento. A Schlumberger, que fabrica equipamentos para o setor de óleo e gás, é uma das empresas que contratou o serviço da startup no Brasil num projeto-piloto.

Outro serviço é a medição de emissões financiadas, cruciais para o setor financeiro – no qual o maior problema está no impacto da sua carteira de crédito ou de investimento. Esse foi um dos pontos que mais chamou a atenção da Nint e fez com que a consultoria debutasse como investidora na rodada semente da Deep. 

“Estamos empolgados com a escalabilidade das soluções para instituições financeiras e investidores, que precisam não só medir seu impacto direto, mas sobretudo o de suas carteiras de crédito e investimento”, diz o CEO da Nint, Gustavo Pimentel.

“Vimos também alguns de nossos clientes muito impressionados com a solução deles para inventário de carbono, que tem potencial para ser global.”