Com tecnologia inédita no Brasil, CPFL leva água potável a indígenas no RN

Projeto de dessalinização vai beneficiar 3 mil pessoas

Com tecnologia inédita no Brasil, CPFL leva água potável a indígenas no RN
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João Câmara, RN* – A CPFL Renováveis e a State Grid, acionista majoritária do grupo CPFL Energia, inauguram nesta quinta-feira um sistema de dessalinização de água com tecnologia inédita no Brasil para comunidades indígenas em João Câmara, no sertão do Rio Grande do Norte, em parceria com o governo estadual.

Cerca de 3 mil moradores das comunidades Amarelão, Serrote de São Bento e Santa Terezinha serão beneficiados pela água potável. Os Mendonça Potiguara, etnia predominante na região, lidam há décadas com a falta de acesso à água na qualidade e quantidade necessárias para atividades cotidianas.

O investimento de R$ 8 milhões teve a chinesa State Grid, uma das maiores produtoras de energia elétrica do mundo, como patrocinadora. A CPFL Renováveis entrou com o apoio da gestão e o Governo do Rio Grande do Norte, com a expertise de sistemas semelhantes.

Serão 80 mil litros de água dessalinizada e distribuída diariamente através de uma adutora de 5 km, com uma torneira para cada uma das três comunidades atendidas.

Por um poço de 146 m de profundidade, a água salobra é retirada dos lençóis freáticos e alocada em tanques de água bruta. Com mais etapas e melhor filtragem que o processo tradicional, a tecnologia usada para a dessalinização tem maior eficácia: a cada litro, 85% da água se torna potável – contra 70% no processo tradicional – e 15% permanece com resíduos.

O sistema é todo automatizado e conta com placas fotovoltaicas para fornecer a energia elétrica necessária.

“O equipamento e processo são inéditos no Brasil. A expectativa é que, funcionando bem, sirva também como exemplo e possa ser replicado”, diz Francisco Galvão, presidente interino da CPFL Renováveis.

João Câmara tem pouco mais de 30 mil habitantes e está próxima de parques eólicos da CPFL. O Rio Grande do Norte concentra a maior quantidade de geração a partir dos ventos da empresa, com sete complexos eólicos e 33 parques, que geram mais de 3 milhões de MWh.

Por um lado, os parques eólicos trazem uma fonte de renda para regiões pobres do semiárido, que sofrem diante da falta de alternativas econômicas. As geradoras pagam royalties para os proprietários das terras onde as torres são instaladas.

Mas, apesar de serem uma fonte de energia limpa, a atividade não está isenta de externalidades ambientais: há quem diga que a poluição sonora das pás altera a atividade de insetos e animais, o que impacta algumas comunidades que praticam agricultura e caça de subsistência.

Problema histórico

Heleno da Costa vive desde que nasceu em Serrote de São Bento. Ali, moram cerca de 400 pessoas — no Amarelão, 1300 e em Santa Terezinha, 1100.

Aos 68 anos, Costa celebra a nova fonte de água potável. Na comunidade, há outro dessalinizador há mais de uma década. “Mas a coisa mais difícil é isso aí. Uma hora tem água, em outra não. A gente pega a água e está salgada pra tomar”, conta.

Os caminhões-pipa, que são uma medida emergencial para a região, não chegam há mais de quatro meses, diz ele. Cada caminhão-pipa garante 10 mil litros de água e custa entre R$ 200 e R$ 350.

Já a chuva aparece por cerca de três meses no ano e não é suficiente para abastecer as cisternas.

Em casas sem torneiras, a água encanada ainda é muito distante. “Não existe um programa estruturado pela Prefeitura. As medidas são todas emergenciais”, diz a pesquisadora e antropóloga da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Taisa Lewitzki. “Não é falta de água, mas de interesse público em manter essa situação de desigualdade”.

O projeto recém-inaugurado deve ajudar, mas não resolver o problema. Pelo planejamento, cada pessoa deve contar com 26 litros de água por dia. De acordo com a ONU, o volume ideal para uso pessoal e doméstico é entre 50 e 100 litros por dia.

Mesmo esse número é questionável, pondera Lewitzki. O Território Mendonça fica em um ambiente rural, com clima árido e chão de terra. A principal atividade econômica é a torra de castanhas do caju, plantadas em outras regiões, que mantém as pessoas em contato próximo ao fogo – o que aumenta a necessidade de água.

As empresas envolvidas já deram início ao processo de doação do projeto para o Governo do Estado, que será o responsável pela operação e manutenção do sistema.

Segundo Galvão, da CPFL, ainda está sendo feita uma análise sobre custos de manutenção, mas serão “extremamente baixos”. Peças sobressalentes para os próximos cinco anos também serão doadas e técnicos da comunidade estão sendo treinados para lidar com a operação. A terra, onde fica a instalação, conta com cessão por 30 anos.

Até a publicação desta reportagem, a Prefeitura de João Câmara e o Governo do Estado do Rio Grande do Norte não responderam aos pedidos de comentário.

*A repórter viajou a convite da CPFL Renováveis.