ArcelorMittal avança no ‘aço verde’

Usina no Canadá substitui parte do gás natural por hidrogênio verde num avanço importante para a descarbonização de um dos setores mais poluentes do mundo

Trabalhador diante de caldeira em usina siderúrgica
Trabalhador diante de caldeira em usina siderúrgica
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A gigante da siderurgia ArcelorMittal anunciou o sucesso de um teste que indica um caminho importante para a descarbonização de um dos setores mais poluentes da economia mundial.

A usina de Contrecoeur, no Canadá, conseguiu durante 24 horas contínuas substituir por hidrogênio verde 6,8% do gás natural usado em uma etapa crucial de seu processo produtivo.

Se obtido por meio de eletrólise da água e com energias renováveis, como no experimento canadense, o hidrogênio tem emissões de CO2 virtualmente nulas.

É por isso que o hidrogênio verde é apontado como parte essencial da solução em setores em que a eletrificação é inviável, como a indústria pesada e transportes de cargas e passageiros por longas distâncias.

Segundo a siderúrgica, trata-se da primeira vez que uma planta de escala industrial e em operação conseguiu o feito. Outras usinas que também utilizam hidrogênio, mas aquele obtido a partir do próprio gás natural e que portanto não representa ganhos ambientais.

Apesar da porcentagem pequena de substituição no teste canadense, qualquer redução das emissões de CO2 na siderurgia tem enorme impacto potencial na contabilidade de gases de efeito-estufa. Estima-se que entre 7% e 9% de todas as emissões de CO2 sejam de responsabilidade do setor.

O hidrogênio verde foi usado em uma etapa que gera 75% do carbono emitido pela planta canadense, a chamada redução do ferro.

A experiência da ArcelorMittal foi feita numa usina de redução direta e não se aplica a todo tipo de planta. No Brasil e no mundo, a maior parte das siderúrgicas usa altos-fornos e carvão para a redução do ferro. (O hidrogênio verde também pode ser utilizado nessas usinas, mas em proporções menores.)

O experimento realizado no Canadá faz parte da meta da companhia de diminuir em 25% a intensidade de CO2 em seus produtos até 2030 e atingir a neutralidade de carbono em 2050.

A próxima fase do piloto será aumentar a injeção de hidrogênio verde e reduzir a de gás natural. “Comprovar essa tecnologia e escalá-la para níveis mais altos pode ser parte importante do quebra-cabeça da descarbonização do setor”, afirmou François Perras, responsável pela operação canadense da Arcelor Mittal.

A empresa já investiu mais de US$ 5,5 bilhões em projetos envolvendo a troca de combustíveis fósseis por hidrogênio verde.

As plantas atuais, sejam baseadas em altos-fornos ou em redução direta, podem ser adaptadas, mas não serão capazes de produzir aço 100% livre de emissões.

A expectativa é que as próximas décadas vejam uma transformação sem igual em uma das atividades que permanecem essencialmente inalteradas há mais de mil anos.

100% verde

O plano da sueca SSAB é obter o primeiro aço 100% livre de combustíveis fósseis daqui quatro anos.

A mudança começa na extração e beneficiamento do ferro, mas a inovação mais importante está na parte fabril, com a redução direta inteiramente baseada em hidrogênio verde.

Uma parte do desafio é técnico: comprovar a viabilidade econômica dessas plantas em grande escala. Outra parte é geográfica. Como o processo consome quantidades enormes do gás, as plantas idealmente estarão próximas de fontes de energia renovável, o ingrediente essencial do hidrogênio verde.

A disponibilidade de energia limpa é um dos itens que podem limitar a ampliação dos testes realizados pela ArcelorMittal no Canadá, como a própria companhia afirma em seu comunicado. 

No Brasil, porém, a abundância de eletricidade de base solar, eólica e hidrelétrica pode representar uma vantagem competitiva importante para a produção do aço verde, ou pelo menos de mais baixas emissões.

A produção de aço via redução direta sempre esteve limitada pelo acesso ao gás natural abundante e barato. No futuro, o hidrogênio verde pode ser um insumo central na produção de aço, o que representaria uma oportunidade de mudar o mapa global da siderurgia.

Mas tudo isso só vai acontecer se e quando o preço do hidrogênio verde cair. Apesar do hype, a produção desse vetor energético ainda está engatinha no mundo todo. Hoje, o carvão custa pelo menos um quarto do H2V. 

Além disso, uma transformação completa da indústria baseada em hidrogênio verde exigiria quantidades colossais de energia renovável dedicadas exclusivamente à separação dos átomos da água. 

Embora seja apontado como o caminho mais claro de descarbonização, o H2V não é o único.

A startup americana Boston Metal, presidida por Tadeu Carneiro (ex-CEO da CBMM), desenvolveu um método alternativo para a redução do ferro, baseado num processo de eletrólise. O subproduto do processo é oxigênio puro, e não CO2.

E, embora não seja uma matéria-prima que possa ter impacto global por causa do volume necessário, o carvão vegetal utilizado em usinas brasileiras também pode dar sua contribuição: a Aço Verde Brasil é a primeira usina de emissões zero do mundo graças a essa fonte de energia