Aliança quer trazer bilhões de dólares para a natureza brasileira

Objetivo da iniciativa é mudar o patamar dos investimentos em soluções climáticas, como recuperação de pastagens degradadas e sistemas agroflorestais

Tony Lent, co-fundador da Capital for Climate
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Um grupo inicial de dez gestores e investidores se reuniu na NbS Investment Collaborative, uma iniciativa que quer mudar o patamar dos investimentos no Brasil nas chamadas soluções climáticas baseadas na natureza.

Os membros-fundadores dessa aliança colaborativa incluem as gestoras JGP, Vert e GEF e o banco BTG Pactual, entre outros. O trabalho é coordenado pela americana Capital for Climate (C4C), organização sem fins lucrativos que se dedica a destravar recursos para o financiamento climático.

Todos os integrantes já estão envolvidos de alguma maneira com atividades como conservação de florestas, bioeconomia e agricultura e pecuária sustentáveis. A ideia é que o conhecimento acumulado sirva de guia para os grandes investidores estrangeiros.

“O volume de dinheiro pode chegar a US$ 2,5 bilhões ou US$ 3 bilhões já nos próximos três anos”, disse ao Reset Tony Lent, co-fundador da C4C.

Para que isso aconteça, faltam informações, networking e bons pontos de conexão ao país, afirma Lent. “Os donos do dinheiro querem bater na porta do país e perguntar: ‘Que oportunidades são essas? Como podemos participar delas?’”

O objetivo principal da aliança é tornar-se um “centro de gravidade” que atraia para o país parte do dinheiro que será destinado nas próximas décadas para a descarbonização e a luta contra a mudança climática.

A fonte desses recursos é variada: de fundos privados a instituições multilaterais e mecanismos de blended finance, que usam dinheiro de filantropia para mitigar riscos e assim atrair capital interessado em retorno financeiro.

O coletivo também vai apoiar empresas interessadas em garantir que suas cadeias de fornecimento não tenham ligação com o desmatamento, afirma Lent.

A aliança foi estabelecida com recursos da Fundação Gordon e Betty Moore, da família do recém-falecido fundador da Intel.

A primeira atividade oficial do grupo será a Cúpula de Investimentos em Soluções Baseadas na Natureza, evento para convidados que acontece no final do mês, em São Paulo. Depois, o plano é apresentar a aliança a investidores internacionais por meio de webinars.

No evento também será apresentada uma nova versão de uma ferramenta educativa desenvolvida pela Climate for Capital em conjunto com um grupo de líderes ligado ao secretariado-geral da ONU.

Organizando o pipeline

Uma das prioridades do grupo é entender e dar visibilidade ao pipeline de projetos que buscam recursos. Outro foco será explicar aos investidores internacionais que, apesar de ainda nascente, esse segmento já existe e é dinâmico no país.

“Queremos mostrar que existe esse ímpeto, que o Brasil tem um ótimo nível de empreendedorismo, que alguns modelos de negócio já se comprovaram”, diz Lent. “Não é cedo demais para investir.”

Além do papel educativo, os integrantes aliança terão importância fundamental também para viabilizar alguns negócios, afirma o executivo.

“Alguns fundos assinam cheques de no mínimo US$ 100 milhões. Como não seria fácil encontrar projetos capazes de absorver uma rodada desse tamanho, você vai precisar de parceiros locais para colocar esse dinheiro para trabalhar.”

Natureza x tecnologia

Das várias atividades com potencial de obter financiamento, Lent acredita que a mais promissora é a recuperação de pastagens degradadas por meio da implementação de agroflorestas ou sistemas silvopastoris.

Outra possibilidade é a restauração com o plantio árvores de nativas que tenham interesse comercial, algo que está no radar de re.green e Biomas, duas empresas que têm grandes ambições de reflorestamento.

Em todos os casos, a geração de créditos de carbono terá um papel crítico, e as várias denúncias sobre esse instrumento publicadas recentemente na imprensa internacional não devem afastar os investidores, afirma Lent.

“Acho que [o questionamento dos créditos de carbono] passa por um ciclo natural na mídia. As definições sobre o mercado regulado e como ele vai se relacionar com o mercado voluntário são mais importantes.”

Trata-se de uma questão pragmática, não dogmática, na opinião de Lent.

Todos os tipos de soluções serão necessários para atingir o net zero global até 2050. Algumas são tecnológicas, como a remoção de carbono do ar. Elas funcionam, mas custam caro.

Outras, que são a vocação natural do Brasil, se baseiam na natureza. Elas vão exigir somente um décimo dos investimentos mundiais até a metade do século – mas vão contribuir com um terço das reduções de emissões de gases de efeito estufa, afirma Lent.

E essa visão vai ao encontro do problema que o país tem de resolver se quiser fazer sua parte no combate contra a mudança climática: 73% das emissões brasileiras estão relacionadas ao desmatamento ou à atividade agrícola, segundo levantamento da consultoria Systemiq.