A guerra dos Friedman: CEO da Nasdaq faz coro por capitalismo inclusivo

A guerra dos Friedman: CEO da Nasdaq faz coro por capitalismo inclusivo
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O tema era “O Futuro do Capitalismo”. E Adena Friedman, a CEO da bolsa americana Nasdaq, não desapontou.

Ao subir ao palco virtual da Expert, evento da XP Investimentos, na tarde de hoje, a executiva logo disparou: “A essência do capitalismo está mudando.”

E o que se viu na sequência foi o endosso aos argumentos apresentados um ano atrás pelo Business Roundtable, associação que reúne mais de 180 CEOs americanos e que resolveu definir o propósito das empresas no sentido de um capitalismo voltado a todas as partes interessadas (stakeholders), em oposição à visão predominante nas últimas décadas de que o acionista é rei.

“Claro que entregar retorno ao acionista é crítico, mas, de certa forma, nos afastamos do que é o verdadeiro propósito de uma empresa: que é crescer e expandir a economia de forma a incluir mais e mais pessoas nessa economia, para permitir que todos prosperem”, afirmou Adena Friedman logo na largada.

O pai do chamado “shareholder capitalism”, agora sob crítica, foi um outro Friedman.

O economista Milton Friedman, professor da Universidade de Chicago e ganhador do Nobel de economia em 1970, lançou as bases do sistema atual cinco décadas atrás com o artigo “A responsabilidade social dos negócios é aumentar seus lucros”, publicado no The New York Times.

Adena Friedman está longe de ser uma formuladora de teorias econômicas do calibre de Milton Friedman. Mas, do alto da vivência empírica de quem dirige uma das principais bolsas de valores do mundo, diz enxergar claramente um momento de transição para uma “nova era do stakeholder capitalism”.

Nesse sentido, avaliou, a pandemia do novo coronavírus deve servir como um catalisador dessa transição, uma vez que expôs muitas das limitações de um sistema que deu atenção exclusivamente aos acionistas nas últimas décadas.

Para ela, a pandemia deixou claro que “as empresas têm responsabilidades com seus funcionários, com as comunidades nas quais estão inseridas; são corresponsáveis por seus clientes e fornecedores. Para assegurar que estamos criando uma economia sustentável.”

A executiva acredita que a covid também fez com que os CEOs de forma geral começassem a enxergar seus papéis de uma outra forma, na medida em que tem havido cooperação com governos para assegurar que as necessidades da sociedade estão sendo atendidas para atravessar a pandemia.  

“Acho que é o começo de uma nova era. E estou animada para ver o que será o futuro do capitalismo.”

Ainda a melhor opção

Na visão da CEO, de todos os sistemas econômicos existentes, o capitalismo certamente está longe de ser perfeito, mas provou ser o mais resiliente. “Mas a essência do capitalismo é dar igualdade de oportunidades para todos para alcançar o sucesso. Não significa que todos que tiverem a oportunidade vão ter sucesso. Mas é preciso dar as condições de partida.”

O campo de jogo hoje não está nivelado, tampouco, reconheceu. Ou seja, as pessoas partem de pontos bastante distintos. É preciso eliminar essas ineficiências.

Friedman acha que é responsabilidade do governo assegurar acesso à educação e à saúde para todos, mas enxerga um papel para as empresas também nesse sentido.

ESG e o papel da Nasdaq

A CEO da Nasdaq defendeu ainda que a mudança passa por uma visão menos curtoprazista por parte das empresas e dos investidores.

Quando uma empresa assegura condições de trabalho adequadas a seus funcionários, provê serviços e produtos também adequados a seus clientes, acabará sendo recompensada economicamente por isso. “E o resultado disso é que seus acionistas terão o benefício de crescimento, criação de empregos, expansão da empresa e lucros.”

Mas é fundamental orientar as decisões da empresa em função dos resultados dos anos futuros e não do próximo trimestre, disse ela. “Isso tudo é o alicerce do investimento ESG, do que chamo movimento ESG, que estamos vendo permear as empresas no mundo todo agora mesmo.”

Na onda ESG que agora varre os mercados, Friedman estabeleceu o que considera ser o papel da Nasdaq — e de outras bolsas de valores.

Não cabe à Nasdaq definir que apenas empresas com bons padrões ESG podem ser listadas. As bolsas devem assegurar que os melhores padrões financeiros, de governança, de transparência de informações e de controles estejam no lugar. “E os investidores devem decidir se querem focar em ESG ou em outra coisa. Essa possibilidade de escolha está na essência do que define a economia americana.”