A aposta da Weg nos caminhões e ônibus elétricos

Multinacional conhecida pelos motores industriais está se concentrando nos veículos pesados, mas quer estar em todas as etapas da eletrificação

Foto do caminhão eDelivery, equipado com motor Weg
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Fundada há 61 anos por um eletricista, um administrador e um mecânico, a multinacional brasileira Weg aposta nesses três “genes” para entrar num mercado que promete ser um dos mais movimentados das próximas décadas: a mobilidade elétrica.

A empresa de Jaraguá do Sul (SC), uma das maiores fabricantes do mundo de motores elétricos para a indústria, agora está de olho em um negócio maior, com mais visibilidade – e mais concorrência –: o da eletrificação do transporte pesado.

A Weg desenvolveu e fabrica os motores do primeiro caminhão elétrico e 100% brasileiro, o e-Delivery, da Volkswagen. Os primeiros 350 veículos já são usados por empresas como Ambev, Femsa e Heineken para a última milha das entregas em grandes centros urbanos. 

Um investimento de R$ 660 milhões anunciado há um mês vai ser dedicado “em boa parte” para aumentar a produção de motores para esses veículos, diz Valter Luiz Knihs, diretor de sistemas industriais e e-mobility da empresa.

O foco inicial são ônibus e caminhões, pois “a experiência e o know-how” da empresa se aplicam melhor a esse segmento, segundo Knihs.

Mas o mapa desenhado pela Weg vai muito além dos sistemas de tração.

A empresa enxerga um futuro em que caminhões e talvez até mesmo carros de passeio sejam equipados também com  baterias WEG – carregadas em eletropostos também produzidos pela companhia.

“Desde o dia em que foi concebida, o objetivo da WEG é eletrificar”, diz o executivo. Agora, esse também é um objetivo do mundo todo – e uma oportunidade única que se abre para a companhia.

Tesla (o inventor)

A Weg é uma das multinacionais mais bem-sucedidas do país. A empresa emprega 37 mil funcionários em 13 países, faturou R$ 23,5 bilhões no ano passado e tem um valor de mercado de R$ 160 bilhões – uma das dez maiores empresas da bolsa brasileira.

Ontem, as ações da companhia fecharam em alta de quase 8% depois da divulgação dos resultados trimestrais, que apontaram uma receita de R$ 7,2 bilhões, um crescimento de 25% em relação ao mesmo período em 2021. 

Seus produtos ficam longe dos olhos da maioria. Em suas 49 plantas, a empresa fabrica mais de 18 milhões de motores, usados principalmente na indústria, que vão de petroleiras a produtoras de celulose.

Além desses equipamentos industriais, que respondem por quase metade da receita e estão em alta demanda especialmente na Europa, a companhia também produz componentes usados em geração, transmissão e distribuição de energia.

O negócio da mobilidade é tão incipiente em termos de receitas que nem é discriminado nos resultados divulgados pela companhia.

Mas a transição para um mundo sem queima de combustíveis fósseis está provocando uma corrida sem precedentes na centenária indústria automobilística.

O conhecimento acumulado nas últimas décadas é um dos pilares da estratégia da Weg no negócio da mobilidade elétrica. A tecnologia básica, diz Knihs, mudou muito pouco em mais de cem anos.

“É o que o Tesla inventou, lá em 1890”, diz Knihs, se empolgando ao descrever uma das inovações que definem a vida moderna.

O motor de um ventilador e de um carro elétrico podem não ser muito diferentes na essência, mas existem algumas considerações práticas importantes – e são elas que ditam o foco da Weg no transporte pesado.

Como seria muito mais complicado passar dos grandes e pesados motores industriais para um pequeno e leve que sirva para um carro, o caminho lógico para a Weg é apostar nos ônibus e caminhões.

Outro fator importante é a demanda. Com a dominância do transporte rodoviário, o Brasil é um dos maiores mercados de caminhões do mundo.

O foco inicial, com o e-Delivery, é a etapa final da logística. Com as vantagens de custo – além de a eletricidade ser mais barata, veículos elétricos são mecanicamente mais simples e exigem menos manutenção –, a virada deve ser rápida, aposta Knihs.

Ele acredita que o apelo ambiental também deve acelerar a transição. “As grandes cidades precisam limpar seu ar. O diesel é o combustível mais nocivo de todos, e a legislação está cada vez mais apertada no mundo inteiro.”

“Depois do Brasil, estendemos a plataforma para os países vizinhos. Já vemos uma grande expansão de ônibus elétricos no Chile e na Colômbia.”

Weg inside?

O e-Delivery tem uma diferença importante em relação a outros caminhões e carros da Volkswagen: o motor foi desenhado e é produzido por terceiros.

Mesmo antes de a Tesla mostrar que a tendência das fabricantes de elétricos é a verticalização, motores sempre foram um diferencial – e um orgulho – das montadoras.

Todas as gigantes da indústria automobilística estão desenvolvendo novos motores elétricos, inclusive a Volkswagen. Haverá espaço para uma fabricante independente?

Knihs acredita que sim. Em primeiro lugar, porque a transição será gradual, e “não custa nada barato montar uma fábrica”.

Além disso, existe uma nova realidade geopolítica sendo desenhada. Os subsídios para veículos elétricos do pacote climático de Joe Biden são condicionados a um mínimo de componentes made in USA.

Knihs acredita que esses tipos de incentivos para a geração de empregos, além de desafios duradouros na logística internacional, favoreçam quem é capaz de produzir perto de onde está o consumo.

Baterias

Além dos motores, a companhia começou a fabricar baterias no Brasil. A logística desse componente, ainda mais importante que o motor nos veículos elétricos, é especialmente complicada e cara por causa de volume, peso e segurança.

Em fevereiro, um cargueiro com milhares de elétricos de luxo pegou fogo no Atlântico. O incêndio começou na bateria de um deles.

A Weg produz os chamados packs de baterias, um sistema integrado que vai fornecer a energia para o veículo. Ele é composto pelas células de íons de lítio (que armazenam a energia e são parecidas com as pilhas de uso doméstico) e sensores e softwares que controlam a tensão, carga e descarga e temperatura, entre outras variáveis.

Além do uso em veículos, Knihs enxerga um mercado de armazenamento de energia, com contêineres que servirão como backup de emergência, por exemplo.

O primeiro desses sistemas foi implementado no Centro de Lançamento de foguetes de Alcântara, no Maranhão, para guardar a energia gerada por uma instalação de painéis solares.

Eletropostos

Mas as baterias que devem ser usadas inicialmente estarão em movimento, dentro de veículos, e precisarão de carregadores – um negócio em que a Weg também quer entrar.

Batizada de Wemob, a linha de estações de recarga tem três modelos com diferentes potências. Quanto mais potente, mais rápida a recarga.

Knihs afirma que o negócio ainda é incipiente, mas potencialmente muito grande. Diferentemente dos postos de combustível, essas “tomadas especiais” estarão em toda parte.

“Muita gente vai carregar o carro em casa, mas também teremos estações em condomínios ou estacionamentos.” A ideia é que a Weg venda o equipamento e eventualmente serviços associados (como sistemas de cobrança), e terceiros operem os terminais.

O mesmo vale para os postos de combustível. “Alguns já criaram consciência e estão instalando essas estações”, diz Knihs. “A margem de lucro é maior do que na gasolina” e, como há uma espera envolvida, o cliente tende a consumir também no restaurante.

Muita calma

Nenhuma companhia consegue estabelecer uma presença global sem inovação.

Mas, no novo mundo da mobilidade elétrica, em vez de competidores atuais como as centenárias Siemens e ABB, a concorrência virá de empresas jovens, ágeis e digitais – algumas que talvez nem tenham sido fundadas.

Knihs afirma que uma das palavras de ordem da companhia é foco: “Em alguns segmentos vamos chegar depois, e outros estamos lá na fronteira, em cima da onda. É o caso dos veículos pesados. Conheço muito bem os projetos em andamento na Europa e na América do Norte.”

“Somos muito bons na capacidade de produzir de forma vertical. Aprendemos o método de melhoria constante da Toyota antes de ela ser essa gigante”, diz Knihs.

“Podemos não ser competitivos hoje em um determinado mercado, mas amanhã seremos. Não dá para fazer tudo ao mesmo tempo.”